quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

3 em 1

Se eu tivesse que descrever um dia típico daqui, não saberia. Aqui não tem nada de típico, tudo é único. Às vezes, me pego pensando que estou no meio do oceano! Esse fato por si só já é bem excêntrico. Mas minha maior piração é sobre a noção de tempo. Logo que cheguei (e lá se vai um ano...) entendi rapidinho como funcionava: um dia equivale a três, mas passa numa velocidade três vezes maior. Não só pra nós, residentes, mas para os viajantes também... quantas vezes ouvi dizer "noooossa, estou aqui há 5 dias e parece que faz quinze!". Além das milhões de coisas que você consegue fazer em 24 horas, sinto que isso se deve sobretudo à intensidade dos acontecimentos. Os dias começam cedo e terminam tarde, os encontros são muitos e, a qualquer hora, podem mudar seu rumo. Totalmente, acredite. O mito de ser "um ilhéu" tem um impacto psicológico muito grande nas pessoas e acho que isso faz com que todos os dias façamos algo inédito ou absolutamente imprevisível acontecer. Ok, você vai dizer, a vida é assim... imprevisível. Mas na Terra do Nunca estamos sujeitos a uma imprevisibilidade tipo "só acontece em filme". Talvez, para explicar, seja realmente necessário um filme, tipo corra lola corra em slow motion ambientado em uma ilha oceânica.
Já morei em outros lugares e sei que cada um é especial à sua maneira.
Mas esse lugar é especial d-e-m-a-i-s. É único: talvez essa seja sua tipicidade.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

insônia.noite3

...porque eu não sei ficar na janelinha assistindo a vida passar. Eu preciso abrir a porta, escancarar as cortinas, deixar a luz do sol entrar. E se vier a chover, eu seco. Seco as lágrimas, seco por dentro, seco a chuva, até o sol voltar de novo. Já fiz isso muitas vezes. Não, não me vanglorio disso. Pelo contrário, gostaria de ter secado menos lágrimas e, sobretudo, de ter secado menos por dentro. Mas é assim que eu sei viver, essa sou eu. Vivo tudo. Depois morro tudo, de morte bem morrida. E depois vivo de novo, como planta que foi podada.
Hoje acordei pensando em você, acho que é porque soube que vai se casar. Felicidades, com gosto de maresia. É o que te desejo. O Feu sempre diz que o único lugar onde ele consegue sentir cheiro de maresia aqui é na Caieira. Estranhamente, é verdade. Mas hoje pela manhã, enquanto o vento rajava a um palmo da areia - como que por magia sem levantar um grão - eu, deitada na minha canga, o sentia acarinhando minha pele e trazendo aquele cheiro antigo e salgado de alga úmida. Tão bom, tão conhecido, tão confortável.

Quem não quer votos de felicidades-sabor-maresia?

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

insônia.noite2

A sala de espera do doctor era desconfortável. Tipo muito. E o doctor sempre atrasava. Tipo muito. Nunca entendi como um ortopedista que atrasa muito podia ter sofás tão desconfortáveis e anti-ergonômicos. Enfim, ele realmente não se importava com isso. Ficávamos lá afundados horas (esperando). Um dia, ele atrasou tanto que eu terminei de ler os textos da pós, o livro que eu tinha levado e já tinha folheado todas as Caras disponíveis. Comecei a arrancar as folhas coloridas da minha agenda e fiz trinta barquinhos de presente pra ele. Quando entrei no consultório, mão cheia de barquinhos coloridos de tamanhos variados, o doctor sorriu do fundo d'alma - acho que ele nunca teve uma paciente excêntrica que fez barquinhos de papel na sala de espera e ainda entrou sorrindo "olha o que eu trouxe de presente pra você!!".

O doctor atrasava porque não tinha pressa em atender. Ele ouvia atentamente minha história de vida, me olhando nos olhos e anotando de vez em quando. Estava interessado em mim, nos porquês das minhas dores. Pediu uma bateria de exames, me revirou do avesso. Entrei naquela máquina de fotografar o cérebro, em outras tantas que detalharam todos os ossinhos do meu corpo, visitei vários laboratórios da cidade. E esperei muito na sala desconfortável. No dia do veredito, ele não usou arrodeios: "querida, seus exames estão perfeitamente normais. Clinicamente, você não tem nada". "Como assim, não tenho nada??? Tenho sim! Eu sinto dores terríveis no meu corpo desde criança, tenho enxaquecas, dores nas articulações, minhas costas parecem as de uma velha de 80 anos.... pelo amor de deus, me fala que eu tenho alguma coisa, qualquer coisa, dessas que dê pra abrir e tirar e depois costurar de novo?".

Não teve jeito.

Nesse dia, o doctor conseguiu arrancar lágrimas de mim e me olhou calado. Perdi 8 meses da vida investigando meu DNA pra descobrir que minhas dores tinham uma raiz muito elementar: minhas emoções. E eu chorava porque no fundo já sabia - só que a solução era um tantinho mais complexa do que deitar numa mesa cirúrgica, cortar e costurar. E eu não sabia nem por onde começar.

Já tinha feito tudo o que podia, experimentado todas as técnicas, de agulhas a ginásticas orgânicas, terapias de vários tipos, até remédios que me deixavam doidona. O que fazer a seguir? mudar de cidade, de emprego, de namorado, de vida?

No pain, no gain, dizia um amigo meu. Custei a acreditar, mas acho que ele tem razão. A dor é uma grande professora. Física, em última instância. E cada vez que essas dores horríveis voltam, me bate um pânico, porque dói de verdade. Mas aí eu percebo que é só porque ainda tenho muito o que aprender.
Sorte que agora eu já comecei.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

refém

Estou muito abalada.

Sofri um sequestro.

Relâmpago - mas anunciado.

Virei refém da minha intensidade, prisioneira das minhas palavras. Cai na minha própria armadilha, tropecei nos meus passos meticulosamente calculados.

Durante o sequestro, um sem fim de auto-torturas. O tempo parecia não passar, um calor sufocante me tirava o fôlego: não conseguia respirar sua presença. Qual será minha culpa? Por que tanto abandono, medo e arrependimento? Ao longe, podia ouvir Marcelo Camelo cantando uma daquelas letras pseudo-intelectuais. Nem pra ter bom gosto musical, esse sequestrador filho da puta... Me fazer engolir rockinhos modernetes com letras melosas e suicidas era a pior parte, sem dúvida. Breve, muito breve, eu sabia que poderia suspirar da pedra mais alta, mergulhar na transparência com um cardume brilhante de sardinhas e me sentir livre como nunca. Mas agora não. Agora era rezar pra ele (o sequestrador, eu mesma?) ter compaixão. COM PAIXÃO. Por favor, por piedade, eu não quero passar por isso de novo. De novo não! Não quero dor, não quero lágrimas, não quero abandono.

Quero morango com chantilly delivery.
Passos de gigante juntos.
Ternura e cafés da manhã com flores.

É isso que eu quero.

E é isso que eu queria ter te falado, desde sempre.

[ufa]

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

bliss

Vou confessar uma coisa: faz tempo que não me sinto assim. Essa lufada de vento que escancarou a porta, a janela, a camisa, a boca. Parece um tufão, um swell gigante desses que cobrem o pier do porto...
Fiquei tão tonta que decidi ir ao médico. Disse a ele que devia ser o labirinto, mas ele receitou remédio pro coração: serenidade. É indicado que eu viva tudo com os olhos e ouvidos bem fechados para o resto do mundo. É profundamente indicado que eu me esqueça do abandono, das ameaças, que eu limpe meu dna emocional das marcas e feridas. "Isso aí é felicidade na certa", ele disse. "Só que tudo em excesso faz mal, você sabe, né?"
Pra amenizar os sintomas: mergulhos no azul, muitos jantares com amigos, algum sol e duas sessões de cinema.

Viver tudo novo.
De novo, mas como se fosse a primeira vez.

O segredo não é correr atrás das borboletas. É cuidar do jardim pra que elas venham até você.
[Quintana]

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

já vi esse filme

Eu me lembro bem quando a gente se conheceu. Você estava sem camisa, fazia calor e eu usava calça de sarja. Achei que você era mais um desses, livre pra amores que vem e vão - e não estava enganada. Mas você me disse que o horizonte era logo ali e que era lindo. Então eu achei que podia pegar o sol com a mão sem me queimar. Mas seu discurso não ecoava em mim. Não acredito em pessoas que não me encaram por mais de dez segundos. Achei você lindo, mas frágil como um graveto seco. E sua fragilidade me comoveu. Me apaixonei pela perspectiva de te salvar, mas a verdade é que a gente não salva ninguém. Já vi esse filme, e nessa eu não caio mais não. Muito obrigada.

"Que beleza é conhecer o desencanto
E ver tudo bem mais claro no escuro"
Tim Maia Racional

sábado, 26 de novembro de 2011

o peixe de manhazinha

O pé saiu do lençol macio e não reconheceu o chão quente de madeira. Pisando leve como uma garça, trocou de shorts ainda com os olhos entreabertos. Qualquer passo move a casa toda, é preciso pisar em ovos pra não acordar o peixe. O peixe. Dormia num sossego de dar inveja. Na noite anterior, se exibia com volteios em seu pequeno aquário, abrindo as guelras e brilhando à luz da lanterna. Ela observava fascinada, não tinham sido apresentados assim tão de perto. Era um peixe homônimo a ela - e parecido com ela. Muito colorido, muito exibido, muito briguento e, ao mesmo tempo, muito delicado. A natureza espelhando nossas personalidades...

O (gesto do) peixe a comoveu: seu nado gentil, cortejo suave espanando seu véu furtacor. Então ele dormia enquanto a luz da manha começava a penetrar a casa - ele gostava de dormir no escuro. Ela se despediu. Deixou bilhete rascunhado de sono interrompido e foi distribuir bons dias.

Hoje o dia amanheceu azul.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

(des)gosto

Escolhi minha profissão de formação com muita calma. Sou privilegiada: fiquei passeando pela Europa e pensando no que fazer da vida. Tive apoio incondicional dos meus pais quando decidi que jornalismo era o que mais se aproximava do que eu amava: comunicação. Estudei com a crème de la crème dos que agora são "formadores de opinião" da sociedade em que vivo. A sala de aula foi importante, claro, mas muita serramalte gelada regava as melhores reflexões que brotavam das aulas do Faro, do Silvio Mieli, da Sandra Rosa. Sinto saudades desta época em que eu ainda acreditava num jornalismo possível. Minha carreira como jornalista foi curta e dolorosa. Curta porque dolorosa e dolorosa porque curta. Foi mais forte do que eu verificar que o jornalismo não era nada do que eu sonhava, era apenas mais um jogo sujo de poder, uma batalha de egos de quem decide o que vai na capa de não sei onde pra prejudicar ou privilegiar fulano ou sicrano. O que me doía era que muitos dos jornalistas que me cercavam não se valiam do verdadeiro poder que têm em mãos, mas se submetiam à chefia, escrevendo matérias enlatadas, sem espaço para reflexão ou crítica. O que me dava desgosto profundo era ver que grande parte dos meus colegas se achava super cool, ligando-se ao status ilusório que esta profissão carrega, cultivando olheiras como troféus. Assim, optei por me afastar completamente do jornalismo. De leitora assídua, hoje posso dizer que mal leio o jornal e, quando leio, me dá dor de estômago. TV então, não assisto há mais de anos... E eu nem sei mais pra onde esse texto tá indo, acho que ele já tem vida própria. Estou falando de uma coisa muito importante e cara para mim e os sentimentos se confundem... a verdade é que eu gostaria de ter sido mais forte e não ter abandonado o jornalismo, mas foi uma opção pela vida. Acho que os que se mantém jornalistas hoje em dia, por idealismo, são comparáveis a professores ou médicos: é por amor ao ser humano, por de fato acreditar que escrever, proferir, registrar algo diferente pode gerar a mudança. Estes são muito mais do que jornalistas: são comunicadores. E isso eu posso dizer com certeza, deixar de ser jornalista foi tão libertador que me tornei uma comunicadora. O gosto amargo de uma mídia corrompida ainda permanece, mas sei que somos muitos do lado de cá, acordando todos os dias para causar no mundo.

domingo, 20 de novembro de 2011

ressalvas

Às vezes desejaria olhar pra vida com menos subjetividade. Estou de plantão quase o tempo todo, na vigília. O coração desafina um pouco cada vez que falta doçura: quer transbordar, mas se contém - por medo ou indiferença. O medo dá pra enfrentar, mas a indiferença é um muro intransponível, como achocolatado insolúvel. O que leva as pessoas a se amarem com tantas ressalvas? Porque certo é que se ama, mas há tantos poréns que já não sei se virou moda ou desculpa ou o quê.
Dia atrás participei de um casamento desses de sonho. Casamentos me emocionam. Acho que isso é meio clichê, mas de fato não vou a muitos casamentos na minha vida e quando vou, me emociono demais. Porque selar o amor daquele jeito é especial: você realmente acredita que vai durar pra sempre. É muito grande, exige coragem nos tempos que correm. Durante a cerimônia, enquanto o céu arroxeava por trás dos Dois Irmãos, uma quantidade sem fim de sensações boas afloraram. O coração explodia de calma, união, felicidade, gratidão, desejos de bem querer até pelos menos queridos. Quem sabe isso quer dizer amor... sem ressalvas e sem indiferença.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

as aranhas também amam

Aprendi a conviver pacificamente com os insetos - exceto as baratas, que ainda me tiram do sério, mas por sorte não há muitas por aqui. Há alguns meses, vivem umas aranhas no meu banheiro, eram pequenas e muitas, viraram grandes e apenas três. Ontem, escovando os dentes, uma delas estava bem próxima ao espelho, então assoprei pra ela se mudar, afinal tudo bem conviver, mas não precisa ser tão de perto! Fui assoprando e ela foi se movendo rumo ao teto, onde estava a outra, coladinha na sua teia. Foi subindo, subindo, até chegar na teia da amiga. Começaram a mover freneticamente as patinhas, talvez por pouco mais de um minuto; para mim parecia mesmo que estavam numa briga danada. E de repente, puft: uma delas fez uma manobra alucinante e colou na outra. Eu, na minha atividade corriqueira de escovação de dentes, olhei incrédula: será que era mesmo o que eu estava pensando?!
Alguns segundos de pausa e logo os artrópodes iniciaram movimentos repetitivos de encaixe. Ah, a natureza: imprevisível e simplismente natural... Eu, pra provocar, dei mais umas assopradas, enquanto a aranha "de cima" movia a extremidade do corpo, tentando se ajustar à parceira, em um movimento muito humano!!
Fiquei impressionada. Não foi só a curiosidade de assistir uma cópula de aracnídeos pela primeira vez na vida, mas sobretudo me tocou perceber que, às vezes, basta um empurraõzinho (ou uma assopradinha...) pras coisas acontecerem! Né mesmo?!?

domingo, 6 de novembro de 2011

roupagem nova

Fiz um pacto comigo mesma: vou passar um dia sem reclamar. Um dia inteirinho, 24 horas, proibida de falar qualquer coisa que seja em tom de queixa, desde "nossa, que calor", até "ai, que dor". Ao meu redor, pessoas reclamam de absolutamente tudo e estou ficando contaminada por esse vício horrível. Quero sentir verdadeiramente o quão sortuda e abençoada eu sou por ter tanta saúde, amor, amigos, trabalho, integridade, felicidade. Felicidade, aliás, é só questão de ser - canta o Jeneci. Quero perceber, na prática, quanto estou reclamando à toa, chorando de barriga cheia, só pra entrar na onda. Quero mais silêncio e reflexâo, menos palavras soltas ao vento sem razão. Quero ser mais Pollyana e, quando alguém vier queixoso, ter a paciência e a sabedoria de apontar para o copo meio cheio. Somos responsáveis pelas nossas escolhas e se as coisas não estão como desejamos, é porque não desejamos direito. Temos o poder e a força de mudar o rumo, vestir uma roupa colorida e sair por aí aproveitando o sol, o calor, o vento ou a chuva.
O que vier é pra ser vivido. Feliz(mente).

domingo, 30 de outubro de 2011

quando o encanto acaba

Ando amarga e reconheço. Quando falta a paixão, fico insuportável. Quando ela me escapa pelos dedos, a apatia entra de sola, a vontade é de nada. A vida fica monotom, monocromática, mono. E eu quero uma vida stereo. De preferência sorround sound. Sigo na busca desenfreada - e um tanto solitária - pelo encanto no dia-a-dia, nas pequenas coisas, pelo prazer na banalidade, pela beleza da cor do céu, que todo dia me parece outro azul. Mas me sinto vencida pelo cansaço. Me sinto frágil, dobrada pelo vento. Preciso de adubo. Não tenho mais forças para me garantir, para me auto sustentar em qualquer situação, para me bancar, para pôr os pingos nos is. Às vezes eu também caio.

Ando amarga e reconheço.
Ando desentancada.
E não sei como me recuperar.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

os 30

Não achei que fazer trinta anos seria tão marcante. Foi lindo, emocionante, representativo. Até pareço uma nova eu - claro que simbolicamente. Estou fã de mim mesma, da minha fidelidade, da minha ousadia, da minha feminilidade. Ando cheia de sonhos e planos realizáveis, por mais loucos que pareçam, e sinto que tudo inspira. Se penso em ficar aqui pra vida, já não acho tão absurdo, mas sei bem que não tenho fronteiras.

De qualquer forma, aqui ou em qualquer outro lugar, o que querer mais da vida, senão vivê-la apenas com saúde, calma e luz?

Tenho muitas coisas pra dizer, cada vez mais. Não há 'coisas que não precisam ser ditas'. Por isso tenho dito - aprendendo a dizê-las. Se não as digo, escrevo. Porque guardadas é que as coisas não podem ficar. Olho pro lado, vejo as pessoas se carregando como chaveirinhos, trofeuzinhos baratos. Intimidade comprada no supermercado. Vejo casais desequilibrados, se amparando em loucuras e excentricidades para seguir juntos. Queria poder gritar para eles: "hey, isso não é amor. Sejam felizes, façam muito sexo e se droguem, mas não banalizem a palavra amor!".

Então olho pra trás e me lembro que já vivi algumas coisas, e que aprendi com elas. Isso é impagável. Já vivi algumas coisas para saber sobretudo o que não quero mais viver. Por vezes choro calada, pagando pelas minhas escolhas. Mas me sinto mais integra assim do que abrindo mão de coisas a mim tão caras, só para não estar só. Olhe agora você: que puta mulher está ao seu lado, seu bobão.

domingo, 18 de setembro de 2011

de tudo um pouco de nada

Faz dias que não escrevo. Dias que tento escrever. É que aqui tudo é tanto, que um pouco já vira muito. Aí eu fico pensando em como reduzir a poucas palavras um infinito de descobertas, de conhecimento, de experiências. Não sei. Sei que tem sido bom demais, ainda que não indolor. Porque desenvolver-se significa abdicar de uma ignorância que apazigua. Desenvolver-se é um caminho sem volta. É uma viagem pra dentro de si, como se fosse uma volta ao mundo, mas sem se mover. E estar em pleno movimento numa ilha no meio do oceano é prova disso. Não tenho a menor ideia de qual é o próximo passo, mas tenho certeza de que os passos que estou dando agora estão me conduzindo pro caminho certo. Às vésperas de completar 30 anos, tenho só uma vontade simples: um desejo doce de amor, que há de se consumar sem pressa, como aquele brigadeiro de colher que você come bem devagarinho, pra nunca chegar ao fim.

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

o amor verdadeiro

Uma amiga foi traída virtualmente. Acho que a dor é tão grande como se fosse presencial, não ter consumado o fato em si não significa nada. A repulsa é a mesma. Quando flagrada, a palavra escrita é mais pesada, mais concreta. Fere fundo ler frases como "estou loucamente apaixonada por você" ou "nunca tive uma conexão assim com alguém", ou até mesmo coisas de teor sexual que você nunca imaginou que seu parceiro pudesse te falar. Completamente apaixonada pelo namorado, está naquele velho dilema: algo se quebrou, não sei como recuperar a confiança, mas é o amor da minha vida. O que fazer? Ele diz que não significou nada, que me ama, mas não consigo confiar nisso. Então diga isso a ele, sugeri. Será?! Diante da cara de dúvida, perguntei: qual é o seu medo? Que apresentando essa desconfiança ele diga: "então, se você não confia mais em mim, é melhor terminarmos"? Talvez...
Então, siga seu coração! foi o que eu disse. Por mais clichê que possa parecer, é a mais pura verdade. Nosso coração, a voz de nossa alma, é a única guia que nunca nos engana. É nossa linha-mestre, nosso termômetro, nossa verdade. E pode apostar que o medo sempre vai surgir pra nos bloquear, pra nos desviar do nosso caminho de felicidade. Mas... e se ele me deixar?? Eu vou ficar solteirona, abandonada??? A solidão vai me consumir?

Pegue o seu coração e deixe-se voar. Seguir em frente, mesmo com medo, é abrir-se para a vida, que pulsa fora de nosso controle. Um dia, quando abdiquei de um amor em prol do meu coração, um amigo querido me disse: "Que incrível lição se apaixonar por alguém, mas quando esse alguém não está maduro para fazer as coisas no caminho de uma integridade, ter o poder de quebrar isso".

A única maneira, é enfrentar o medo, sem medo.
Não existe amor mais verdadeiro do que o amor para com você mesmo.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

saudades de você

Ando de saco cheio desses hóspedes. Descobri, nestes poucos meses de experiência no ramo hoteleiro, que ser uma boa recepcionista é MUITO difícil. Chamar o hóspede pelo nome, perguntar como foi o passeio, preparar um mimo, sorrir sempre, estar sempre disposta a conversar, contar sua história, fazer indicações certeiras sobre o que ver, onde e o que comer, providenciar todas as solicitações em 5 minutos e, acima de tudo, fazer cara de paisagem quando eles começam a xingar seu país, reclamar da perereca que entrou no quarto ou do buggy que quebrou no meio do caminho... é foda!!!!!!! O ser humano é muito louco! É bem legal, por outro lado, fazer parte do sonho dessas pessoas. A maior viagem é você indicar um lugar e dar tudo certo, eles voltarem satisfeitos e te agradecerem por isso, dizendo que foi inesquecível. Raro, mas acontece. Eu mesma, que nunca fico em hotéis chiquetosos quando viajo, guardo lembranças incríveis de pessoas que me hospedaram e que me cobriram de atenção e carinho. Então, via de regra, procuro fazer o mesmo, mas está sendo difícil ultimamente. Só que hoje chegou um casal de espanhóis muy distinto. Muito rico, muito raça-superior. Olhei pra ele, que deve ter seus setenta anos, e tinha todas as razões para considerá-lo mais um chato-perguntador-de-coisas-exóticas-e-repetitivas. Ao contrário disso, me bateu uma incrível ternura. Não fez muito sentido, mas cuidei do check in deles de maneira exemplar, apresentando a pousada e conversando sobre o céu azul, o mar e a paz. Ambos muito sérios, foram se derrentendo com minha receptividade. Foram ver o pôr do sol na praia, programaram passeios e sairam pra jantar. Nessa hora, entraram na recepção para entregar as chaves e o Sr. Luis me disse: "sabe que você se parece muito com a minha neta?". Eu fiquei em silêncio por alguns segundos. E de repente, entendi tudo: "...sabe que o senhor se parece muito com meu avô?!", respondi. Ambos sorrimos. Ele deixou a chave em minha mão e, junto com ela, um olhar profundo, como quem traz um recado. E um perfume intenso que meu velho sempre deixava em mim quando passava, onde quer que fosse.
Olhos mareados. Vida curta pra tanta saudade.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

olhos nos olhos

O problema não é quando a gente se cruza: é quando nossos olhares se cruzam. Encontrar a sua pupila me desconcerta, porque só assim consigo ler a sua alma. Me assusta ser flechada pela sua culpa, um olhar de dor de quem nunca se despediu. O seu olhar, que despisto na curva do rosto, me olha com admiração. Posso sentir isso quando, acidentalmente, perco a linha do queixo e me jogo dentro da sua retina: você me admira. Quando deveria me sentir lisonjeada, na verdade preferia um olhar indiferente, blasé, plano, desapercebido. Mas ele só consegue ser cortante, fundo, avassalador.

E me corta por dentro.

Resta que o que foi sem ter sido, será de outra forma.
Não tem como se enganar. E nem fugir do que tem que ser.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

ressaca

oi, meu nome é ressaca. Eu existo porque você não tem limites. Sou feita do seu material mais fino: seu inconsciente. Nasci da possibilidade de você manifestar suas vontades reprimidas em momentos de puro deleite. Eu causo esquecimentos e retomo dores do passado. Passo a noite inteira trabalhando pra você acordar com um gosto de cabo de guarda chuva na boca - pode escovar os dentes quantas vezes quiser, não vai se livrar dele tão cedo. Eu deixo você imprestável, sua cabeça latejando, seus olhos pesados, suas costas doendo. Causo ânsia de vômito, desânimo, falta de apetite, letargia e mau humor.
Mesmo com tudo isso, eu sou reincidente na sua vida. Como aquele amor viciado, para o qual você promete que nunca mais vai voltar. No dia seguinte, arrependimento. De novo? Por que? Mas eu tinha prometido que isso não ia mais acontecer...!

Pois é, delícia maldita. Essa sou eu, muito prazer.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

sumiço

"Sumi porque só faço besteira em sua presença, fico muda quando deveria verbalizar, digo um absurdo atrás do outro quando melhor seria silenciar, faço brincadeiras de mau gosto e sofro antes, durante e depois de te encontrar.
Sumi porque não há futuro e isso não é o mais difícil de lidar, pior é não ter presente e o passado ser mais fluido que o ar.
Sumi porque não há o que se possa resgatar, meu sumiço é covarde mas atento, meio fajuto meio autêntico, sumi porque sumir é um jogo de paciência, ausentar-se é risco e sapiência, pareço desinteressada, mas sumi para estar para sempre do seu lado, a saudade fará mais por nós dois que nosso amor e sua desajeitada e irrefletida permanência".
[Martha Medeiros]

domingo, 31 de julho de 2011

telefonema

Noite passada tivemos uma conversa de nunca acabar. Você me contava estórias deliciosas da sua infância. De viagens, do seu avô. Você estava fanho e tomando chá de alho pra curar a gripe (e a ressaca). Aí você pediu pra eu cantar pra você. Eu quero a sorte de um amor tranquilo, com sabor de fruta mordida. Nós na batida, no embalo da rede, matando a sede na saliva.

...e você não parava de repetir – que linda, que linda! Me disse que estava chegando, que eu não devia me preocupar, pois tudo chega no tempo certo. Eu suspirei de leve, tentando não deixar você perceber que para mim chegadas são na verdade partidas e que nada nem ninguém chega pra ficar. As pessoas tão de passagem, eu disse. Não, eu vou pra ficar! – você respondeu.

Tudo que eu vejo ao meu lado, tudo que eu sonho, vai entrar no coração.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

vê se me esquece

Se você soubesse quem é Itamar Assumpção ou Alice Ruiz, eu ia cantar pra você aquela música deles. Ia ser mais engraçado, mais sutil, mais elegante. Mas como eu já perdi a esportiva e imagino que no seu universo limitado não haja espaço pra poesia, prefiro te mandar diretamente pro quinto dos infernos. A puta que te pariu também pode ser um bom lugar pra você ir. Ou pra casa do caralho. Enfim, perto de mim é que eu não te quero. Tô muito possessa da minha vida: você não tem o direito de se aproximar de mim, não te dei essa liberdade. Como se já não bastasse seu truque sujo, seu caráter questionável, sua aparência dúbia. Tenho pena da sua insegurança e da sua mediocridade. Por favor, respeite meu espaço, pois eu respeito o seu. E dê-me respeito, porque eu não sou da sua laia.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

estado civil: noronha

Moro em uma vila de três mil e quinhentos habitantes. Esta vila se divide em três tribos: locais (ilhéus), estrangeiros (haules) e turistas. É triste e engraçado ao mesmo tempo, porque mesmo num universo tão pequeno em que praia e balada são lugares democráticos onde todos se encontram (com pouca roupa, é bom que se diga...), os guetos continuam existindo, determinados, obviamente pelo nível sócio-econômico e cultural de cada pessoa. E, como bons "homens cordiais" que somos, aprendemos que segregar na cara dura é muito feio, mas também não nos misturamos nem a pau - pode crer!

Um detalhe importante é que em qualquer uma das tribos, o número de cromossomos XY é imensamente superior ao de XX. Pra quem faltou nas aulas de biologia, simplifico: há muito mais homens do que mulheres - o que, no meu entender, gera um descompasso hormonal em todos os níveis. As mulheres ficam insuportavelmente competitivas para abocanhar a parte mais suculenta do boi, além de alvoraçadas e açanhadíssimas, pois são cobiçadas sem pausa por predadores sedentos. E os homens perdem a noção, porque na falta, qualquer coisa serve (simples assim, como só a alma masculina sabe ser!).

Mas voltando ao começo (porque eu adoro ziguezaguear pelos assuntos), eu faço parte da tribo dos haules. Diria, chutando, que são uns mil individuos desta espécie, talvez menos. Todos se conhecem, convivem, se encontram com frequência e, eventualmente, se envolvem. E como já foi dito, não se misturam. Conclusão? A troca de casais é uma prática ordinária desta tribo, sem muitos critérios ou regras. É meio um vale tudo de deixar qualquer Contigo! no chinelo... Aliás, eu diria que tá mais pra Ilha de Caras (perdoem o trocadinho infame, hehe).

Eu não sei se é certo ou errado e nem pretendo julgar com este olhar.
A gente perde um pouco esses parâmetros aqui, porque a lei da sobrevivência fala mais alto. Mas o fato é que valores eu não perco: sei bem quando impera a falta de respeito, quando o carinho e o cuidado com o outro são só substantivos vazios, quando se quebra a confiança de uma maneira tão brusca que é impossível recuperá-la. E isso é muito triste, porque a tribo continua tendo mil indivíduos que se conhecem, convivem... mas aparentemente se encontram apenas no tamanho da sua solidão.

Estado civil: Noronha.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

vento bom

Parece que já se passaram alguns meses desde a minha volta. O retorno de saturno dando as caras de novo, com tudo. Pequenos terremotos internos, um novo módulo, um novo amor, uma nova companhia de quarto, um novo armário... O mar está mais frio, o sol mais fraco, o céu enevoado. E o vento sopra forte, dia e noite, parece querer abalar minhas verdades. Então, quando acho que não tenho mais onde me escorar, ele muda de direção, levantando poeira, deixando uma bagunça danada do lado de dentro, como quem diz: “tudo não passa de uma rajada, não há o que temer”.

Apesar do nó na garganta, sigo firme, inspirando fundo a noite clara. Abro os braços ao caminhar, para receber suas rajadas de peito aberto. Por mais que doa, sei que a qualquer momento pode mudar de direção e soprar a meu favor. E não vai demorar.

"Viração, virando vai
Olha o vento, a embarcação
Minha jangada não é navio não
Não é vapor nem avião
Mas carrega muito amor dentro do seu coração".
[Corrida de Jangada]

domingo, 10 de julho de 2011

eu to cansada

Sempre desconfiei dos quietinhos. Dos bonzinhos, nem se fale... Têm uma mania de enxergar o mundo com óculos maniqueísta: falta-lhes a compreensão de que somos seres duais, bons E maus, que amam E odeiam, que explodem E se recolhem, como na natureza as flores, as marés. Nos últimos anos, tenho feito imersões profundas em mim mesma para tentar ser mais quietinha e mais boazinha, sempre mantendo minha essência. E devo dizer que consegui avanços consideráveis. Honro muito essas conquistas. Herdei da mãe um temperamento explosivo, do pai uma visão demasiadamente realista da vida, e agora finalmente sinto um encontro comigo, com quem eu sou. E eu não sou nada fácil, não me iludo. Mas quem é fácil, afinal?!? Os bonzinhos??? Os quietinhos??? Por que eles são "mais fáceis" do que eu?

Tô meio cansada. Vejo e sinto minha evolução, mas sou continuamente julgada pelo que ainda não evolui, como se já não bastasse o peso da minha própria cobrança. Tô cansada, porque apesar de mais boazinha e mais quietinha, continuo incomodando demais. Meu limite não é reconhecido, meu esforço não é reconhecido. To cansada de demonstrar tanta disponibilidade e ainda assim ter que me esforçar pra ler nas entrelinhas dos bonzinhos. E fico pensando se tô tão enganada assim sobre quem eu sou e como eu ajo... acho que não, né?! Deve ser só cansaço mesmo.

Good night. And good luck.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

a praça dos sonhos

Eu não sei como funciona a vida para os que não sonham, mas deve ser muito chata. Eu sonho demais e muitos dos meus sonhos se tornam realidade material e concreta em frente aos meus olhos. Quando isso acontece, uma sensação de imenso prazer me invade, meu corpo formiga, não consigo (nem quero) esconder sorrisos. Aqui em Fernando de Noronha, um grupo de pessoas (eu incluída) está trabalhando num projeto de resgate de uma feira de artesanato que há 12 anos não acontece. Estamos reunindo os artesãos da ilha, trabalhando com seus sonhos, suas visões de futuro, seus desejos. Bonito de ver. Além de valorizar a arte e os produtos locais com um viés de sustentabilidade (escolhido por nós), pretendemos que esta feira se transforme num espaço de encontro para a comunidade, onde todos possam se sentir em casa, acolhidos por um clima de entusiasmo, encantamento, inspiração. A feira tem acontecido e tem sido um sucesso, mas é claro: estamos encontrando diversas pedras no caminho. Faz parte. Bate aquele desânimo, vontade de desistir, me pergunto porque eu sempre me meto nessas pra me matar de trabalhar... me desgasto... e no final, sobra o quê?!

Há algumas semanas, decidimos dar uma pausa no evento para avaliar o processo, melhorar de fato o que precisa ser melhorado e resolver algumas questões pontuais dentro do grupo organizador. Noutra noite, caminhando solta pela brisa, passei em frente à praça onde a feira ocorre. A praça não sofreu nenhuma interferência estrutural significativa: apenas uma grande luz verde foi instalada no topo de um coqueiro. Bastou isso. O que pude ver? A mesma praça iluminada por uma lâmpada verde?? Não. O que eu vi foi meu sonho se tornando realidade, ali, aos poucos, muito sutilmente. Crianças brincando de pega-pega, jovens senhoras conversando e rindo da vida, pessoas caminhando e curtindo o barato de ter uma luz verde iluminando a praça que antes servia de estacionamento. Essa cena boba e corriqueira me fez sorrir e pensar que as coisas são muito mais simples do que imaginamos. E que tudo parece pequeno quando já passou. Então, em resposta à minha pergunta: resta o sonho. E isso não é pouco não.

terça-feira, 28 de junho de 2011

burgovanguardistas

Ele, administrador de empresas - na verdade cineasta frustrado. Ela, recém chegada de Harvard. Alugam apartamento espaçoso no centro da cidade: edifício Hortência. Decoração minimalista. Do cubo branco ela sabe falar, apesar de nunca ter lido Rosalind Krauss. Sobre o chão de mármore da sua casa-conceito, espalham despretenciosamente exemplares do New York Times e Der Spiegel. Imagem é tudo, aprenderam em Harvard.

Do outro lado da cidade, planejam ter gêmeos. Ele engenheiro, ela empresária. Mas... como? Planejar ter gêmeos?! Sim, acreditam que hoje tudo se resolve com dinheiro e remédios. Até a vida.

Noutra manhã, um cineasta batiza a filha na igreja, com direito a padre, água benta e tudo. Artistas, cinegrafistas, produtores, todos os "amigos" presentes, mas desconfortáveis: coisa mais demodê batizar a filha na igreja, pelamor, hein?!

Tem também um encontro deslocado do tempo e espaço convencionais, sem logica, sem razão num apartamento cool na zona oeste com vista extensa sobre a cidade molhada. Ele, que enxerga tantos pela sua lente - bichos e gente - não consegue parar de falar de si. Ela só queria contar que vai finalmente fazer uma tatuagem, mas não conseguiu.

Enquanto isso, tomamos vinho nesta noite muito fria em que imagem é quase nada e damos muita risada de todas as imagens. Como diria Alice Ruiz, somos vanguarditas, pois extremamente contemporâneas.

sábado, 11 de junho de 2011

estrangeira de lugar nenhum

Aqui é um pouco terra de ninguém, mas todos se sentem muito daqui. Aqui é uma ilha, então o sentimento de pertecer é diferente do que em qualquer outro lugar, acredite. Ou você pertence, ou você vaza. Dizem que, quando bem vindo, a ilha te engole. E que ela mesmo se encarrega de te cuspir quando não for mais pra você ficar. Dizem também que cada um tem "seu tempo" de ilha: quando der a sua hora, você irá em paz, sem a sensação de que deixou algo pra trás.

As pessoas se referem ao continente como "lá fora". Hoje me perguntaram: "onde você mora mesmo?". Eu respondi "No Trinta". "Nããão, eu quis dizer onde você mora de verdade... lá fora!".

Ah, tá. "É que eu moro aqui agora, entende? Mas eu nasci em São Paulo".

Satisfeito com a resposta, sem querer mais filosofar, calou-se. Mas dentro de mim ficou a sensação forte de pertencer.
Eu não sou estrangeira.
E moro aqui.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

por hoje, é só

"O real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia".

Guimarães Rosa

domingo, 5 de junho de 2011

disconnection

Minha vontade, neste momento, é dizer tudo aquilo que não disse, de uma vez só, num jorro. Minha vontade é ser agressiva, ferina, usar da minha ironia e do meu sarcasmo pra te fazer sentir um grão de areia. Minha vontade é que você reconheça minha raiva, mesmo que pra isso eu tenha que gritar e te xingar. Não me importo mais com seus conceitos sobre mim e não quero mais me esforçar para que sejam bons. Não, não sou uma pessoa maravilhosa, você se enganou. Redondamente. Aliás, essa história toda é um engano, desde o primeiro segundo. Então estou na dúvida: se utilizo esse método cartesiano, assim as coisas ficam bem explicadinhas e sem brecha para repescagem, ou se coloco meu coração à disposição, como fiz até hoje, para nos conduzir ao entendimento mútuo de que essa história está uma merda. Pego na sua mão, te olho com ternura e compreensão (como fiz até hoje, repetindo), e te pergunto: "você acha que as coisas estão legais?", "Você acha que seu comportamento tem sido adequado, coerente e equilibrado?". Tento estabelecer com você um diálogo e no final nos olhamos com aquela sensação de "puxa, que pena, poderia ser tão legal...". Mas não é. Eu não estou ficando louca, já vivi coisas legais, sei o sabor que elas têm - e certamente não é esse. Agora chegou o momento de usar uma boa dose de racionalidade, deixar de lado os sentimentos, os medos, as boas lembranças para se conectar com a razão das coisas. E me desconectar de você.

sábado, 4 de junho de 2011

lealdade

Ando com dor de barriga frequente. É a dor do medo. Vem da ideia de você não vir, não chegar, não confirmar, não aparecer, não me priorizar, não me ligar. Na cabeça resolvo tudo: sei perfeitamente o que devo fazer. Mas meu corpo não responde. Se deixa tomar pelas emoções e fica totalmente entregue. vulnerável. Não consigo enganá-lo. É como se eu já conhecesse o desfecho, mas não quero aceitar. Não quero aceitar que tantos impasses sinalizem a morte já anunciada. É mais bonita a ilusão de que eles servem para nos fortalecer, para criar bases sólidas para um “nós” que não existe. Mas ilusões são traiçoeiras, assim como as verdades homeopáticas. Preferia receber um tapa na cara bem ardido, do que carregar essa dor de barriga constante. Lembro sempre do Dario cantando "Lealdade" pra mim, olhando bem fundo nos meus olhos. "Serei leal contigo, quando eu cansar dos teus beijos, te digo. E tu também liberdade terás, pra quando quiseres bater a porta sem olhar pra trás. Quando os teus olhos cansarem dos meus olhos, e o teu sorriso cansar da minha voz. Quando o teu corpo tiver cansado dos meus braços não é preciso haver falsidade entre nós".

Por favor, seja, apenas, leal.

sábado, 28 de maio de 2011

panela de pressão

Outra tarde, entrei numa igrejinha com uma portinha que parecia de um conto de fadas. Era muito pequena mesmo, tanto a igreja quanto a porta. Sentei no banco ao lado do altar, olhei pra nossa senhora da Conceição e comecei a conversar com ela com toda inocência de uma criança que faz um pedido pro Papai Noel - e acredita piamente que seu pedido será atendido.

"Eu quero o pai pros meus filhos. Um cara bonito, pero no importa mucho - que fique claro que se for bonito, não vou achar ruim. Mas que seja, acima de tudo, bonito por dentro. Sincero, honesto, boa indole. Que goste dos meus amigos. E que meus amigos gostem dele. Que tenha um papo bom, bom, bom de doer de tão bom, porque isso é o que me dá mais tesão na vida: conversar. Não precisa ter dinheiro, mas sem dívidas é um requisito. Que seja bom de cama (não vou entrar em detalhes, mas pra ela eu pedi tudinho!!). Uma pessoa que tenha tons de cinza, mas muitas cores pra dividir. Que tenha um humor leve e uma boa relação com a mãe. Que tenhamos os mesmos gostos, porque esse negócio de opostos que se atraem só funciona na física mesmo. Eu quero um homem a quem eu possa amar em igual medida à medida que ele me ama. Com quem eu possa trocar de pele de vez em quando. Saborear doces e salgados, ter gatos e ver as mesmas belezas da vida".

Mas teve um pedido que eu esqueci de fazer naquela tarde pra Conceição: que esse homem seja livre e seu coração, desempedido.

domingo, 22 de maio de 2011

prisioneiros do amor livre

...acho que é da Martha Medeiros essa frase. Título de uma crônica dela que li há algum tempo, sobre aquele livro bonito que ganhei da Ju, que conta a história da Simone de Beauvoir e do Sartre. Queria ter esse livro agora em minhas mãos, para reler um trecho que certamente sublinhei na época, em que Simone dizia da incapacidade de seu homem de ser verdadeiramente livre no amor. Sartre apregoava a liberdade suprema, uma relação aberta com Simone: ele tinha outras mulheres e ela, por sua vez, seus amantes. Mas no fim das contas, nenhum dos dois bancava a brincadeira. Ela arranjava mulheres pra ele e literalmente adoecia, prisioneira do seu amor por Sartre. Ele, escravo da sua ideologia de liberdade, parecia obcecado em se ater a este estilo de vida mais para provar sua teoria do que por acreditar nela. Enfim, um desastre.
Aí acontece que, quase um século depois da Simone e do Sartre, percebo que não sabemos lidar com nada disso. E acho que não aprenderemos. É muito da boca pra fora que a gente aprova que o outro tenha outros. Principalmente para os homens, é muito difícil aceitar que topamos o que eles propoem - na verdade eu acho que eles nunca nos levam a sério. Então bom mesmo é o que vem do coração, quando ele fica todo preenchido com alguém insubstituível, alguém que você não vai encontrar em mais ninguém. Amor livre o cassete! Descobri que sou bem egoista nesse ponto: eu quero um só pra mim.

domingo, 15 de maio de 2011

c.o.r.a.g.e.m

Em qualquer lugar, até mesmo no paraíso, têm dias em que o desconforto toma conta. A alma fica pequenina, não vence a falta de sol, não encontra espaço para o amor. O corpo adoece, a mente se culpa, a auto estima se esconde. Com certa frequência, minha voz desaparece. Geralmente ela se vai porque deixei de falar algo que precisava. Mas desta vez, foi diferente: ela se calou para eu me calar. Preciso aquietar o coração e olhar para dentro. Ouvir mais a intuição, que é a voz da alma, gritando para mim.

E - fundamental - preciso de coragem para segui-la.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

você-é-a-mulher-mais-bonita-que-eu-já-conheci

Antes, me penetra fundo seu olhar, na dor da indecisão. Seu olhar, sem medo de encarar, encontra o meu ainda mais destemido e se fixa, sem desviar, como se quisesse me garantir nossa felicidade.

Depois, é quando a gente se abraça, e o mundo para por alguns segundos. Se encaixa sua cabeça na minha saboneteira. Perfeitamente. Fica ali, armazenando meu cheiro, que você diz que adora. Emaranhando nos meus cachos, que você diz que adora. Vontade de te aninhar no meu colo, meu coração amolece de ternura. Busco conectá-lo, pulsante, com o seu adoentado. Sinto sua barba mal feita roçando no meu rosto, sem entender porque essa não pode ser uma cena cotidiana. E então percebo que, mesmo que seja pouco (e eu nunca me contento com pouco), prefiro ter você inteiro nestes minutos do que o dia inteiro pela metade.

Pílulas de felicidade que não me deixam desconfiar do amor.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

germinar

cada um vira um pouco o outro na arte de se encontrar, se entender, se reconhecer. Na dúvida, no experimento, na ousadia, nos movimentos de libertação, na explosão. Cria=se uma identidade na intersecção de sonhos, valores, algo maior que quer nascer e não sabe o que é. Na verdade falamos todos sobre a mesma coisa: amor. 'Não excluir' é a máxima. No nível sutil: ver o invisível, ouvir o inaudível e sentir o que nunca antes foi sentido. Emoção genuina.

terça-feira, 26 de abril de 2011

essencial

Hoje me lembrei do slogan do whiskey Buchanan's: "o essencial permanece". Esse whiskey teve um papel importante numa noite lá no Bourbon Street, quando tomei um porre homérico enquanto tentava me fazer notar por um cara que depois veio a ser uma pessoa muito importante na minha vida. Naquela noite eu ainda não sabia disso (nem ele), e saí de lá carregada pela Gabi, que foi me resgatar. Faça-se justiça: Gabi já me resgatou muitas vezes. Mas nem sei porque estou contando isso... ah, sim ...porque aqui tem chovido horrores.

E quando chove: parar.

Raramente consigo parar, sou uma pessoa ativa até demais, não sossego. Gosto do frisson da vida e me envolvo em mil coisas ao mesmo tempo, com pessoas diferentes. Essa sou eu. Falo muito, gesticulo muito, sou muito intensa, tenho um perfil analítico, múltiplos interesses nos quais vou a fundo quase sempre. E gosto de conversar sobre questões existenciais. Essa é minha essência. Então eu decidi que vou parar de lutar contra ela pra querer ser alguém que não sou. E agora queria ter um copo de Buchanans aqui do meu lado só pra comemorar que o essencial permanece. Cheers.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

gosto de você, mas não é muito

na verdade eu gosto mais de mim, de certo. Em primeiro, segundo e terceiro lugar, sou eu que importo. É comigo que eu acordo todos os dias, é a minha cara que olho no espelho e perplexa pergunto: mais uma vez, sua trouxa?!? Sou eu mesma quem seco minhas lágrimas, mordo o lábio e amargo o coração - por alguns segundos apenas. Depois tudo vira ternura. Olho para baixo: só o chão e meus passos, que já são mais de um milhão rumo ao entendimento profundo de mim. Busco ser uma pessoa melhor a cada dia - e acho que consigo. Por isso, de ti não guardo raiva nenhuma. Nem ressentimento, nem nada ruim. Gosto de você, porque você é uma pessoa extremamente gostável. Sensível. Mas no fundo não provoca emoção. Seu olhar é diplomático, suas reações, calculadas. Seu nome é responsabilidade, caracteristica que estou tentando afastar de mim, cada vez mais. Você não se deixa acessar, acha mais seguro dividir sua intimidade com a cachorra. Talvez por essas razões, eu goste de você, mas não é muito. Então, o que haveria de errado em estar com você apenas para tomar um banho quente de vez em quando, ou assistir um filme num dia de chuva? Nada. E seria muito bom. Mas persigo uma leveza que não consigo conquistar e isso me aflige. Não consigo. Talvez porque eu goste de você um pouco mais do que muito.

domingo, 10 de abril de 2011

again (and repeat)

Sabe o bom de estar chegando aos 30? Aprender a passar pelas experiências da vida sem reabrir feridas, revistar dores e reafirmar crenças cristalizadas. Conseguir enxergar que cada nova experiência mal sucedida traz mais ganhos do que perdas. E que não é preciso de dor para fazer valer a vida. Sem dor é muuuuito mais legal!

Talvez, se eu tivesse escrito essas linhas ontem, seria um melô como os meus habituais, chorosos e poéticos, rasgando o coração. Mas estou gostando de deixar o drama descansar um pouco pra encarar as coisas com mais objetividade e pragmatismo - preciso aprender isso com meu pai. Nada como um dia com uma noite no meio. Sim, é verdade, estou um pouco cansada do universo masculino, de sua previsibilidade, de sua infantilidade. Mas as coisas são como são. "Não há no mundo lei que possa condenar alguém que a outro alguém deixou de amar". E quem nunca amou ninguém, não sabe o tamanho que isso tem, então a insegurança é desculpável. Sim, sobra um pouco de raiva, indignação, incompreensão. "COMO ASSIM??? Eu sou tãããão legal, como é possível que esta pessoa não enxergue que eu sou a melhor coisa que aconteceu na vida dela????". Ser preterido nunca é fácil. A dor do abandono é a que mais dói, depois da dor da morte - que não deixa de ser um abandono.
Mas tudo são reencontros e a vida é um ciclo que se repete.
Again and again.

sábado, 26 de março de 2011

de como exterminar um medo

Não gostaria de escrever sobre coisas desagradáveis, mesmo porque o vento levou o cinza embora e sol voltou a brilhar. Mas faz-se necessário um hiato para honrar as superações e entender uma das razões de estar aqui. A barata: minha relação com este inseto é absolutamente inexistente. Nunca consegui encará-lo, matá-lo, nem sequer evitá-lo. A presença dele me paraliza, causa suadouros frios e quentes, detona em mim todos os medos ancestrais. Minha grande felicidade, quando aportei aqui, foi perceber que não havia número significativo deste inseto. Ok, posso dormir tranquila - pensei. Vez em quando via um aqui, outro ali, mas nada que me tirasse do prumo. Eis que ontem se deu o primeiro grande encontro: tarde da noite, já pronta para cair nos braços de morfeu, ela apareceu. Tamanho moderado - afinal a primeira prova de fogo não pode ser assim tão dura! Eu tinha duas escolhas: sair do quarto praticamente nua e nunca mais voltar até que alguém se encarregasse de trucidar aquele ser execrável (o que não era uma possibilidade, já que estava absolutamente sozinha), ou matá-la! Apanhei então minha havaiana. Suando (claro!), ainda exitei por alguns segundos antes da chinelada certeira.

Pááá!

Será?? Será que está mesmo morta?! Levantei o chinelo e lá jazia o cadáver, de cabeça pra baixo. Imóvel. Ok, pensei, vou deixar para recolhê-la depois, afinal tinha que me recuperar da grande emoção de matar uma barata pela primeira vez em 29 anos! Minutos depois volto ao banheiro para executar a desagradável tarefa e... cadê o bicho?!? Como assim?? Eu matei, esmaguei o inseto, matei matado mesmo! Certamente não conseguiria dormir se não achasse aquela barata mal matada. Essa foi a parte mais penosa, mas lá estava ela, num canto do banheiro, viva como antes. Impressionante!!! E agora sim, com toda a vontade e xingamentos merecidos, dá-lhe chineladas ferozes. Suspirei aliviada. Me senti vitoriosa e percebi, mais uma vez, que para superar os medos é preciso enfrentá-los. De frente.

quinta-feira, 17 de março de 2011

liberdade

Pode parecer loucura, mas o momento mais esperado do meu dia é caminhar 2 km às onze e meia da noite saindo do trabalho de volta pra casa. O céu carpetado de estrelas, o morro do pico brilhando. Do lado esquerdo, o cavalo come capim. Ele para e levanta a cabeça quando eu passo. Passo lento, largo, aproveitando a tranquilidade da noite profunda. Posso escolher entre o som dos sapos, dos grilos, dos passos - lentos, largos -, e o meu ipod, fiel companheiro que traz saudades conhecidas e sempre novas descobertas.

Pode parecer loucura, mas nunca me senti tão livre. Paradoxo: “presa” numa ilha que um dia foi presídio, onde o ali é já oceano. Mas livre como nunca. Sinto a liberdade da natureza, a vida pulsando sem parar. Sinto o tempo que passa porque o sol nasce e a lua cresce e míngua. Entristece-me um pouco quando chove, mas entendo que é preciso deixar molhar pra receber o sol quando voltar.
É aqui que cabe minha vida agora.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

all at sea

eu não sei: essa é a expressão que mais tenho usado. Quanto tempo você vai ficar? eu não sei. Você está gostando? eu não sei. O que você quer da sua vida? eu não sei. Você me ama? eu não sei. Só sei que quero estar sempre perto do mar. Isso eu sei.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

morte súbita

Às vezes, pra se sentir vivo, é preciso morrer um pouco. Viver muito alimenta minha loucura necessária. Viver pouco, me deixa insossa e desinteressada. Assim, de quando em vez, preciso morrer. É uma precisão quase vital de parada cardíaca, pra sentir o sangue quente formigando pelo corpo, quando o coração volta a bater. Como em apneia, aquela breve sensação de desespero quando o ar escasseia: um prazer imensurável quando se atinge a superfície para respirar. Eu preciso encarar o precipício, sentar na beira e ficar balançando as perninhas, até um vento forte bater pra me fazer sair dali. A natureza é sábia demais. É nela que me miro: na sua força e imprevisibilidade de morrer sempre um pouco para viver muito (e mais).

domingo, 23 de janeiro de 2011

bebamos!

Aqui tudo chega de barco, até o correio. Deve ser o único lugar do Brasil onde o sedex leva 10 dias pra chegar. Dependendo dos naufrágios, chuvas, marés e vontade dos homens de bem, o barco às vezes não chega. Aí falta água. Falta gás. Falta comida. Fruta? Artigo raro. E caro. Também deve ser o único lugar do Brasil onde a banana custa uma fortuna. Mas não são só bens de consumo que faltam aqui.
Falta vergonha na cara do Governo de Pernambuco. Falta vontade política, falta educação, consciência ecológica, economia criativa. Falta tudo isso. Mas cerveja nunca falta.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

felinianas

Os gatos de Noronha são carentes. Eles miam muito, gratuitamente. Um miado firme, decidido, de quem não se arrisca no pedido. Mimados, insistentes, obstinados, chegam a ser grosseiros: aprenderam que para viver aqui, ou é assim ou vão morrer de fome. Em 10 dias de ilha, morando com 14 homens em um alojamento coletivo, lavando roupa na mão, indo a pé pro trabalho debaixo de tempestades, mergulhando até 18m de profundidade, nadando com tubarões e raias, trabalhando muito, comendo pouco... percebi que pra viver aqui precisa mesmo ser muito macho! Falo daquele estereótipo de macho nordestino, forte, duro, imbatível, de poucas gentilezas, machista, mas no fundo muito carente. Os homens aprenderam com os gatos que aqui, para viver, é preciso de uma crosta protetora. Eu, avessa a qualquer barreira que me impeça de acessar gatos ou seres humanos, estou sofrendo um bocado - mas aprendendo dia-a-dia. Reforço que a afetividade, a amorosidade, o sorriso e a gentileza são a única via possível para mim. Ontem mesmo já conquistei o primeiro gato. Miado estridente atrás de um pão de queijo que eu comia. Dividi com ele, fiz um afago. E ele ronronou.
Simples assim.