terça-feira, 28 de novembro de 2017

a tua presença

Então o tempo passa. E em mim passou uma miríade de sensações. Cheguei a pensar que não havia nada mais para ser dito. Pensei que não te amava. Depois, que seria impossível não te amar. Então comecei a estudar finamente o amor em seus diversos aspectos: gratidão, compaixão, liberdade. 

É isso: eu te amo. Estava resolvido. 

A partir desse momento, me permiti sofrer em paz. Mergulhei em águas profundas. Sua ausência cada vez mais pungente. Oras bem, oras no chão. CHÃO. Cheguei a pensar que não iria mais te encontrar. Depois, fiquei imaginando como seria estar na sua presença. Insistia na sua presença. Internamente, alimentei a esperança genuína de te olhar e desgostar de todo você. 

Então, um café. Aquele café que tinha tudo pra ser amargo. Mas não foi.

Foi eu te ver de barba mal feita que quase desmaiei [acho que você fez de propósito]. Foi um abraço de mais de um minuto que a livraria inteira parou pra invejar. Foi risada, história, lágrima, pedido de perdão. Foi tanto carinho e tanta verdade, que nem sobrou espaço pro ressentimento. A mágoa foi fazer morada noutro lugar. A raiva saiu com o rabinho entre as pernas. Foi caminhada lenta com vontade de não acabar mais. 

Foi tão gostoso estar na tua presença que eu quase me esqueci que a gente não é mais um casal.

Ismael Nery, Nós, 1926

segunda-feira, 13 de novembro de 2017

dor de crescimento

Noite passada você sofreu muito. Contorcia seu corpinho de recém feitos 4 anos, sentindo dores nas pernas, nas juntas, nos músculos. Tão cansado de tanto pulo, correria, diversão... como você brinca gostoso, filho!

Mas durante a noite, sofreu.

Não acordou, mas choramingava alto, reclamando das pontadas agudas que um dia de intensas atividades e ansiedades gerou no seu corpo. Eu massageava suas perninhas.
Tentei arnica. Tentei lavanda. Tentei sucupira. Tentei amor - no meio da noite insone.
Até que, de exaustão, você dormiu.

Você está crescendo e está doendo.

Então eu queria te falar uma coisa, filho: crescer dói. É assim mesmo. Essa sua dor física é uma amostra do que há de vir pra quem é buscador como você. Você nasceu buscador, como sua mãe. E quem busca, nem sempre acha, mas sempre desabrocha.

Buscar é motor pra crescer. A dor passa. O crescimento fica.
Buscar é sair do casulo e virar borboleta.
Buscar é expandir. É olhar além. Encontrar beleza e realeza.
Buscar é experimentar o novo sem medo. E com medo também.

Que suas buscas andem sempre de mãos dadas com seu crescimento.
E não se preocupe: a dor passa.

 


sexta-feira, 3 de novembro de 2017

despedida

Eu queria ter tido a chance de me despedir de você. De olhar lá no fundo dos seus olhos para desvendar o que sua alma guarda. Eu queria poder te dar um abraço demorado. Dizer que sinto muito. Sentir seu coração batendo pra ter certeza de que ele não congelou. Eu queria te dizer o quão injusto foi fazer tantos planos e deixar que eles derretessem como gelo no sol. Eu queria ouvir de você que existe outra pessoa, porque só assim essa ruptura covarde, virtual e insensata faria algum sentido.

Eu queria te ver frágil e sensível, sem máscaras.

Queria que se deixasse amar - independente de haver ou não algo entre nós. Eu queria mesmo que você pudesse receber este amor que estou cultivando em mim - não este amor banal, carnal. Amor de Ser Humano. Queria eu também receber seu cuidado. Não este cuidado de homem/mulher: cuidado de Ser Humano. Gente que se cuida porque se importa.

Mas nada mais importa. E não sei se algum dia de fato importou. Hoje acho que tudo não passou de um grande mal entendido. Chego a pensar que aquela manhã ensolarada podia ter amanhecido nublada e chuvosa, assim quiçá nunca teríamos nos cruzado na vida. Mas não há como mudar o que foi. Só há como mudar o que é. Essa dor que me rasga o peito, essa incompreensão, esse vazio que você deixou em mim: isso vai mudar. Hoje.