segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

pé na estrada

Volto pisando rente aos passos que eu mesma dei pra ir. Não há rastro tão seguro quanto o que eu já tracei. Porque já ousei demais, sim. Essa é minha faísca. Só que agora é diferente: é ousadia equilibrada, é impulso cauteloso. Vida que continua pulsando, mas com maturidade. Na aflição de uma viagem que se promete transformadora, percebo, na verdade, que ela já foi iniciada. Ela é todo este caminho percorrido, já pisado, revisitado agora com passos paralelos, mas nunca sobre as mesmas pegadas. Ela é pra dentro e para fora, ao mesmo tempo, sem ponto de chegada definido. Ela é feita de paisagens jamais monótonas, certamente muitas montanhas a serem atraversadas.
Esta viagem é necessária e inevitável.

domingo, 22 de janeiro de 2012

como faz?

Subject: como?
Date: Thu, 19 Jan 2012 22:01:33 -0200

Ei. Essa coisa de sumir do mapa e ir pra longe...
Como faz?
Tua opção me cativa um bocado.
Ouviria histórias se quiser contar.
Bjo.
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Muitos amigos têm me escrito manifestando vontade de voar.
Deixo aqui um pouco da minha transpiração - que a cada dia se transforma em muita inspiração.

Meu querido,
Sou tão feliz pela minha escolha, que poderia passar a noite aqui te dando motivos para me imitar. Como? Como é muito fácil: arrume uma mala pequena, compre a passagem e parta pra onde o teu coração sugerir, mesmo que você não saiba direito o que está indo fazer lá. Foi assim que eu fiz.
Mas eu sei que não é a este "como" que você se refere. O movimento, ao contrário do que parece, é algo que está dentro de nós, então você só o fará se ele fizer profundo sentido para você. E mesmo que ele faça sentido, não é fácil. Na verdade, eu diria que é difícil pra caramba. É preciso ter muito desprendimento, força de vontade, confiança e alegria pra suportar a distância total da sua zona de conforto. Mas vale à pena, porque se afastando dela, você abre espaço para o novo, um espaço que você nem sabia que existia dentro de você. Se estiver disposto a enfrentar o medo do desconhecido, o medo de baratas, o medo da solidão, será recompensado de maneira absolutamente surpreendente, com um pote dourado dentro do qual estarão todas as ferramentas para a sua FELICIDADE. Se estiver com a mente aberta para aceitar verdadeiramente as diferenças, se tiver tempo para olhar a natureza e diariamente se der conta da efemeridade da vida, será muito menos penoso lidar com as crises existenciais e com as coisas que te desagradam. A vida se tornará mais leve e você, uma pessoa melhor.
Não sei te dizer exatamente "como", não tem receita de bolo. Levei alguns anos para efetivar essa escolha. Fui arando o terreno, regando um pouquinho todos os dias, preparando a retirada e, sobretudo, consultando meu coração, precioso oráculo. Me perguntava se a vontade de partir não era meramente uma fuga. No fundo, não me iludo: acho que todas as partidas são fugas, mas fugir consciente é diferente de fugir por fugir. Então, atenção a este ponto. E se for uma fuga descarada mesmo, que seja bem claro do que você está fugindo, porque pode ter certeza de que vai voltar - mesmo que você more no paraíso.
Ontem ouvi que minha vida é uma "montanha russa". Achei essa imagem bem engraçada. Irônico que, quando criança, eu ia ao playcenter e nunca gostei desse brinquedo que me deixava com enjôo e me dava muito medo - nunca subi em uma. No imaginário coletivo, a montanha russa é um desafio delicioso: todo mundo quer andar nela, pra poder gritar a vontade, extravasar, viver os medos face to face. No fundo, a gente gosta.
Então, depois de tudo isso, se eu puder te dar um conselho: vá andar de montanha russa, passe pelos loopings, frios na barriga, vômitos, frios, suadouros. Passe pela experiência, por todas as possíveis, se possível. Não deixe que as experiências passem, passe você por elas. Depois você vai ter muito mais do que um bocado de histórias pra contar: vai perceber que ainda tem um SEM FIM de descobertas por fazer.
Beijos,
Beta

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

feliz aniversário

que engraçado: eu não me livro de você. Mesmo se eu for morar no Butão ainda vou encontrar alguém que ouça interessado à história de como a gente se conheceu, que eu te pedi em casamento no primeiro encontro e que você adorou. Por que, convenhamos, qual é a chance de alguém me abordar na rua e perguntar se eu te conheço numa ilha no meio do oceano??? Passam os anos e nossos caminhos voltam a se cruzar, por um motivo ou por outro, a gente se encontra na fila do cinema, ou no meio da noite eu te ligo pra te perguntar... "que música é essa mesmo?". Eu não sei porque isso acontece, você é tipo uma ressaca. Nem sei como ainda sei seu número de telefone decor, acho que deve ser o único no mundo que eu sei decor, mesmo sem discá-lo há anos. Mas eu desconfio que tem amor demais na música que sempre nos uniu, e que talvez a gente tenha se gostado o suficiente pra nunca nos separarmos definitivamente. Não importa quem a gente namore pro resto dos dias, com quem a gente case ou tenha filhos. A gente já foi pra nova iorque e comprou all stars coloridos e pegou o "A train".
Apesar de tudo, eu acho nossa história linda. Fomos passaportes pra sermos pessoas melhores. Feliz aniversário.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

ilhada

Tô. Tô sim. Melancólica até debaixo d'água. Fui mergulhar cinza, esperando voltar azul, mas lá embaixo a melancolia só tem outro peso, outra densidade, outra cor. Ela continua penetrando, viscosa e opaca. O mar estava inquieto, exigiu concentração. Só depois, navegando de volta ao porto, barco feroz rasgando ondas escuras, me deu tempo de pensar em como a felicidade desaba sobre mim com a mesma intensidade que a tristeza. Altíssimos e baixíssimos, diria sabiamente a Gabi. Tô melancólica porque há 4 dias estou absolutamente desconectada do mundo, sem internet, sem telefone, sem a liberdade de poder me comunicar. Pela primeira vez, me sinto literal: estou ilhada. Tô melancólica porque a saudade dos meus amigos está cortante, falta-nos coragem para transpor a distância. Porque sinto falta repentina de cheiros conhecidos, de deitar no meu futon com a Vitória, fechar a porta de casa e deixar o mundo lá fora.

Hoje eu só queria soltar a cabeça no colo da minha mãe e usufruir do melhor cafuné do mundo.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

como é bom voltar a ler clarice

"(...) Porque eu me imaginava mais forte. Porque eu fazia do amor um cálculo matemático errado: pensava que, somando as compreensões, eu amava. Não sabia que, somando as incompreensões, é que se ama verdadeiramente. Porque eu, só por ter tido carinho, pensei que amar é fácil. É porque eu não quis o amor solene, sem compreender que a solenidade ritualiza a incompreensão e a transforma em oferenda. E é também porque sempre fui de brigar muito, meu modo é brigando. É porque sempre tento chegar pelo meu modo. É porque ainda não sei ceder. É porque no fundo eu quero amar o que amaria - e não o que é. É porque ainda não sou eu mesma, e então o castigo é amar um mundo que não é ele. É também porque eu me ofendo à toa. É porque talvez eu precise que me digam com brutalidade, pois sou muito teimosa (...)".

[Clarice Lispector]
in Felicidade Clandestina - Perdoando Deus

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

o que eu mais gosto

O que eu mais gosto daqui não é difícil de dizer. É estranho - pensei: é como dizer qual é a minha música preferida... impossível! ... porque este lugar é um presente diário, são tantas lindezas, tantas sensações boas, realmente é um lugar que te proporciona muitas coisas das quais é fácil gostar muito. Mas a coisa que eu mais gosto, estranhamente, é fácil de dizer. Não é uma praia, não é um bicho, não é uma vista, não é uma pessoa. É um encontro fugaz, sempre inesperado, que te leva pra outro planeta: mini-conversa de troca intensa, que revela tanto sobre a cultura do outro, que pode servir pra você conhecer alguém novo, ou só mesmo pra rever um conhecido e perguntar como foi o dia de hoje. Esse ato tão simples pode, na verdade, mudar a sua vida. Dar carona é um hábito que perdemos porque perdemos a confiança em nós mesmos. É maravilhoso e libertador recuperar essa sensação de confiança: dormir de porta aberta, largar a chave no contato do carro, deixar a vida solta para inspirar. Dar carona é sensacional: é confiar que a essência do homem é pura, que ele não quer se apossar das “suas” coisas, que ele não quer te ferrar, te estuprar, te matar... Por que diabos ele faria isso??? É estranho como desaprendemos sobre nós mesmos desde que nascemos: somos ensinados a ser quem não somos e criamos uma imagem terrível da humanidade.

Numa dessas mini-conversas, um desconhecido se transforma no portador de palavras colocadas em sua boca exatamente para mim. Em breves minutos, minha vida, que andava sombreada, se torna pura luz, como se toda a sensatez tivesse sido despertada, como se um véu, um vento bom, uma mão tivesse passado sobre a minha testa. E noutra ocasião, um casal vira meu guru: me diz (sem saber) o que devo fazer com uma precisão cirúrgica. É uma graça estar receptiva a tantos sinais. Talvez exatamente por saber que o momento vai acabar logo ali, na esquina.

"Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade (...)"
[Clarice Lispector]

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

soluço

Chove, mas segue seco.

A cada nova chuva, soluço poeira. Ou pó - porque tem cheiro de coisa velha. Daquelas que ficam ali estagnadas, até que alguém resolve tirar do lugar, pra descobrir que não devia ter feito isso. Porque agora há tanto pó pra limpar. Tanto pó pra soluçar. Tanto pó pra espirrar, que nem toda a chuva do mundo faria molhar.

Sinto seco.
Boca seca, olhos secos, coração seco.

Eu não disse que ia chover e que eu ia secar?

domingo, 8 de janeiro de 2012

elevation of love

Então me espreguiço e suspiro uma maquiagem no rosto pra vida ficar mais colorida. Mas tem dias que só pintando a cara toda mesmo, ai como eu queria pintar a cara toda, passar um batom vermelho, muito blush, encher os olhos inchados de rimmel, talvez o nariz da Levita também caísse bem. Pena que algumas coisas eu fui abandonando pelo caminho... também não dá pra carregar a vida toda numa mala, né!? E como a cara toda também não dá pra pintar, deslizo suavemente o pincel, clareza e suavidade pra enfrentar o dia com a beleza protegida.
Outra coisa que não dá mais é pra continuar matando uma a uma essas atormentadas formigas voadoras, tem que haver outro jeito de eliminá-las coletivamente - sim, eu sou eco cri cri, mas já tentei até inseticida; não funciona. Estou exausta de ter que fazer absolutamente tudo por mim: sinto vontade de me abandonar um pouco. Mas olho pro lado e não consigo. Na verdade, é acima de tudo de mim que tenho que cuidar, dá trabalho mas é retorno garantido. Investimento seguro. Entendo quando meu pai diz que lhe falta motivação. Como encontrá-la, se já não há? Onde buscá-la, se já partiu? E como fazer isso... sozinho?!?
Simplicidade (com ternura). Voltar à paz de não precisar fazer nada e sentir o prazer do ócio criativo sem culpa. Voltar pras artes, mais música, mais pintura, mais teatro. Voltar pro coração, sem medo. Voltar pra dentro.

Viajar.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

lé com cré

Onde escrever tudo aquilo que você não pode contar pra ninguém? Aquelas vontades secretas ou lembranças lambuzadas? Como expor suas ansiedades sem assustar o mundo??

Não. Não me venha com essa de que "não é preciso escrever, nem se expor e nem sofrer". Escrever é imperativo para mim (bem como me expor, bem como sofrer). É vital, para clarear a existência, para que nossas reações façam sentido, depois de reagidas.

Mas sim. É difícil escrever sobre as nossas fragilidades. Deve ser por isso que existe a ficção: é muito mais confortável fazer outro alguém carregar seu lado nojentinho, que você custa admitir. Mais fácil se esconder atrás da loucura alheia, difícil é admitir as próprias - já escrevi sobre isso, várias vezes.

Então, por favor, não me entenda mal. Eu não sou over, não sou louca (sim, sou muito louca!!). Sou muito mulher, mas às vezes, menina. Não tenho grandes vergonhas, só sei ser espontânea. Não sou nada, senão eu mesma.

Me lembrei de uma frase singela que a Julia Roberts fala pro Hugh Grant em Notting Hill: "I'm just a girl, in front of a boy, asking him to love her".

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

alô?

Alô? Alou! Oiiii, ahhh... Feliz ano novo!!!!!!!!!!!
É que as linhas aqui estão impossíveis, não estou conseguindo falar com você... que bom que deu certo agora! Como você está? Pulou sete ondinhas? Fechou os olhos e desejou coisas boas? Abraçou muito sua mãe? ãhn? Quê, não to ouvindo, tá cortando a ligação... Sim, por aqui tudo ótimo. Fui à praia, tomei banho de mar. Foi sagrado. Meditei um pouco, rezei um pouco, agradeci muito. Fiquei leve como uma flauta. Desejos? Desejei poucas, mas grandes coisas. O tempo aqui parece andar na velocidade da luz, a única coisa que parece chegar nunca é o dia da sua volta.

Vontade urgente de te ver.

Alô? Você tá aí?