quarta-feira, 14 de julho de 2010

linhas tortas

Sentimentos amplos com varanda
Pro interior

Cansei
De ter que ler amor nas entrelinhas

Nas lágrimas que me fecham portas
O amor que escreve certo em linhas tortas

terça-feira, 13 de julho de 2010

se sente pequena, tão impotente, cercada por tantas regras e sistemas. São Paulo não é mais o seu lugar - talvez nunca tenha sido. Mas ela fica se enganando, achando que pode passar por cima, ao lado, por baixo. E vai superando os próprios limites, como se respeitá-los fosse desrespeitoso. A superação é o lema do homem moderno.

Mas agora que o tecido tá esgarçado e a pele, já à mostra, mostra o que não se quer ver, o que fazer agora? Tanta fragilidade que haja creme nivea.

Cair não é tão ruim quanto ter que levantar. Levantar dói muito mais.

E apenas porque nada, absolutamente nada, parece fazer sentido e tudo parece se repetir ad infinitum ela não quer se levantar.

Tá?

segunda-feira, 12 de julho de 2010

eu, modo de usar

Pode invadir ou chegar com delicadeza, mas não tão devagar que me faça dormir.

Não grite comigo, tenho o péssimo hábito de revidar.

Acordo pela manhã com ótimo humor mas… permita que eu escove os dentes primeiro. Toque muito em mim, principalmente nos cabelos e minta sobre minha nocauteante beleza.

Tenha vida própria, me faça sentir saudades, conte algumas coisas que me façam rir, mas não conte piadas e nem seja preconceituoso, não perca tempo cultivando este tipo de herança de seus pais.

Viaje antes de me conhecer, sofra antes de mim para reconhecer-me um porto seguro, um albergue da juventude.

Eu saio em conta, você não gastará muito comigo.

Acredite nas verdades que digo e também nas mentiras, elas serão raras e sempre por uma boa causa.

Respeite meu choro, me deixe sozinha, só volte quando eu chamar e não me obedeça sempre, que eu também gosto de ser contrariada. (Então fique comigo quando eu chorar, combinado?).

Seja mais forte que eu e menos altruísta!

Não se vista tão bem… gosto de camisa para fora da calça, gosto de braços, gosto de pernas e muito de pescoço.

Reverenciarei tudo em você que estiver a meu gosto: boca, cabelos, os pelos do peito e um joelho esfolado, você tem que se esfolar as vezes, mesmo na sua idade.

Leia, escolha seus próprios livros, releia-os.

Odeie a vida doméstica e os agitos noturnos.

Seja um pouco caseiro e um pouco da vida, não de boate que isto é coisa de gente triste. Não seja escravo da televisão, nem xiita contra. Nem escravo meu, nem filho meu, nem meu pai. Escolha um papel para você que ainda não tenha sido preenchido e o invente muitas vezes.

Me enlouqueça uma vez por mês, mas me faça uma louca boa, uma louca que ache graça em tudo que rime com louca: loba, boba, rouca, boca…

Goste de música e de sexo. Goste de um esporte não muito banal.

Não invente de querer muitos filhos, me carregar pra a missa, apresentar sua familia… isso a gente vê depois… se calhar…

Deixa eu dirigir o seu carro, que você adora.

Quero ver você nervoso, inquieto, olhe para outras mulheres, tenha amigos e digam muitas bobagens juntos.

Não me conte seus segredos… me faça massagem nas costas.

Não fume, beba, chore, eleja algumas contravenções.

Me rapte! Se nada disso funcionar (…)

Martha Medeiros
in Cartas Extraviadas e Outros Poemas

quarta-feira, 7 de julho de 2010

tchááu!


do Orla, que nunca me deu minha ilustra de presente, mas parece que fez essa pra mim.

domingo, 4 de julho de 2010

dora

Hoje o almoço de domingo em família contou com um membro sui generis. Ela foi "adotada" pela minha vó Marina, lá nos idos anos de 1983, quando começou a trabalhar em sua casa como empregrada doméstica. Eu tinha uns 2 anos de idade. Minha nonna, com seu português mal ajambrado, tentava ensinar àquela então jovem menina do interior de Minas Gerais alguma palavra que fizesse sentido, a assinatura do próprio nome, ou a contar o dinheiro do paozinho francês. De pouco adiantou: Dora permaneceu quase completamente analfabeta. Mas passou a considerar a minha avó como mãe, e talvez tenha sofrido mais do que todos nós quando ela se foi, em 1992. Acompanhou de perto o câncer da sua mãe de adoção, suas idas e vindas do hospital, cuidou dela como uma filha devotada. Me viu crescer e nutriu por mim o amor de uma irmã mais velha. E nunca perdemos o contato. Para ela, eu continuo sendo a Nina, aquela menininha de 3 anos. Aos meus olhos, ela não envelhece, apesar de seus 51.
Só que Dora parou no tempo. Com sua voz de criança, ela fala da minha avó no presente, como se ela ainda estivesse viva, e sua mente oscila entre a racionalidade lúcida e o seu mundo de palavras inventadas. Hoje por exemplo, ela disse que a atual patroa quebrou a "veícula", querendo dizer "clavícola". Também tentou explicar o que ela chama de "dinheiro grudado" - uma nota de R$ 20,00 que na verdade são duas de R$ 10,00 grudadas. Será isso?!? Ela começou a ficar nervosa tentando se explicar, então achei melhor entender assim...
Este mundo é muito confuso pra ela. Não é loucura, é um "mundo-dorado" todo particular, misto de ingenuidade infantil e manias de uma pessoa bem velhinha.

Os domingos ficam muito mais genuinos e generosos quando ela está por perto.

Quando olho pra mim não me percebo
Tenho tanto a mania de sentir
Que me extravio às vezes ao sair
Das próprias sensações que eu recebo.

Álvaro de Campos
Três sonetos (1913)
in Poesia Completa

sexta-feira, 2 de julho de 2010

tudoaomesmotempoagora

socorro: férias. Preciso sair dessa cidade maluca, que nunca, nunca, nunca dorme. Inclusive eu não durmo, fico aqui pensando na viagem, no trabalho (ou na falta dele), no frila, no tás a ver?, no imbecil com quem saí na semana passada, no outro com quem saí na semana retrasada. Rememoro os encontros de ontem, as cervejas de hoje. Concluo que a minha vida é muito boa e o mundo tá muito gay, caramba! ... o canto, a conta bancária, todas as coisas que ainda quero fazer, todas as que quero deixar de fazer. E no que vou ler nas férias. Hoje fui ver "Empoeirados" no Oficina. Fazia anos que não ia lá e que não ouvia uma das músicas que eles cantaram na peça, canção tão doce, como tudo que a Ceumar faz. E essa música me trouxe outro pensamento: que a arte existe pra nos lembrar de que estamos vivos. São Genésio, conceda a todos o ganha pão, para que não nos esqueçamos da vida.