terça-feira, 31 de agosto de 2010

sorriso

Fechei a porta e o dong tocou. Me contaram que o dong, quando vibra, deixa pra fora todas as energias negativas, protegendo a casa das coisas estranhas e mantendo aqui dentro apenas aconchego. Funciona mais ou menos como os sapatos, que eu tiro antes de passar a soleira, diariamente, para livrar o ambiente das cargas da rua.
Então, depois de um show louco, chocolate, massagem e longo abraço (e outro), você calça os sapatos e me deixa um sorriso no rosto. Permanente. Que até agora, 20 minutos depois, teima em quase me causar caibra nas bochechas. Me deixa com esse sentimento que não sei explicar - e que bom que é não saber explicar alguma coisa na minha vida! É bom e isso basta. Preenchimento. E sorriso.

onda

Hoje, no metrô, um menino lá sentado e muito compenetrado estudava física. No caderno dele estava escrito: "onda - propagação de uma perturbação através de um meio transferindo energia, mas não massa". Fiz questão de anotar, porque minha vida está sendo inundada por ondas de energias muitos boas.
Quase un tsunami, na real.
Amén.

domingo, 29 de agosto de 2010

pamonha de pirrrracicaba

como é que pode??? você aparece na minha frente e eu simplesmente muda, inerte, anestesiada, passo firme, vendo você ir embora... Esperando por um fondue que nunca aconteceu. Eu sou uma pamonha mesmo, uma pamonha de pirrracicaba, igual àquelas que cantavam no carro de som aos domingos quando eu morava no Paraíso.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

cadê você?

Teria dado uma boa foto: encostada naquela parede de um azul bonito, apoiada numa só perna, a outra dobrada com o pé sujando a parede azul - como as mães dizem que não pode fazer quando a gente é pequeno -, o olhar perdido entre gays, velhos, casais, finjo observar todo mundo entrando, mas só espero você descer as escadas sorrindo, carregando algum papel na mão como sempre, sinestésico como eu. Espero o seu olhar buscando o meu no meio da multidão, a breve aflição por pensar que eu poderia não estar ali encostada com o pé na parede azul bonita. E então, quando você entrasse, iria desviar o rosto pro chão e fingir que não me viu, só pra eu te ver primeiro e puxar teu sorriso. Aí você iria chegar certeiro em mim, sorrindo. E colocar os braços entre os meus ombros, prensando levemente meu corpo contra a parede azul, me deixando sem ar sem sequer precisar me tocar. E eu iria suspirar de alivio por você ter chegado, tão pontual, tão preciso nos seus gestos delicados, nos seus movimentos cotidianamente calculados.
Encostada na tal parede azul, o tênis sujando o azul que alguém pintou com cuidado, eu pensando "cadê você?". "vem, estou aqui te esperando, te procurando. te reconheço no meio dessa gente toda, pode vir!". Ganas de me fundir com aquele azul profundo, eu me perguntava "mas cadê você?". "por que você não chega? onde é que você está?". Os atrasados entraram apressados, repararam em mim, imóvel na parede azul bonita. Ao toque do terceiro sinal, suspirei, não de alívio, mas de cansaço. Desamarrei cuidadosamente os cadarços e deixei ali, ao pé da parede, meu all star vermelho. Pra se acaso você chegasse.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

leve, leve, leve

Andava pela rua levitando, soprada por um vento de fim de inverno. Apesar do ar sufocante, seu corpo parecia estar expandido, e ocupar toda a calçada. Sentia as pessoas passarem através de si, observavam sua falta de pressa. Confiante, firme no seu propósito de estar satisfeita, andava tão segura que nem um temporal poderia dissolver seu sorriso. Os passos eram palmas a ressoar no eco da cidade.

domingo, 22 de agosto de 2010

axé

Quanto mais eu vejo, conheço e sinto, mais me convenço de que é tudo a mesma coisa e vem da mesma raiz. Pode ser axé, amém, aleluia, babanam kevalam, shanti ou namaskar. Pode ser missa, festa, mantra, Deus, Baba, Allah, pastor, padre, rabino, pai de santo... tanto faz. O que importa é a energia vital, a intenção do pensamento, a força da crença. Na noite passada tive uma experiência muito bonita de encontro com a alegria, com a música, com a fartura. Cultuar, cantar, dançar, rezar, fechar os olhos, celebrar são coisas boas. E só podem ser de Deus.

sábado, 21 de agosto de 2010

silêncio

Apesar de todo o barulho, este é o momento de reencontrar-me comigo mesma. Não há nada para fazer, nenhum lugar onde ir, a marca do meu silêncio permeia tudo o que eu faço. Prefiro encontrar pessoas em sintonia com o meu silêncio, ou desfrutar da minha solitude para repousar internamente neste momento precioso.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

recortes

Não sei bem se este é o melhor momento de arrumar coisas, mas eu gosto de exorcizar logo: jogar fora o que tem que jogar (quase tudo) e guardar pequenos detalhes que me causem sorrisos instantâneos. Tava segurando um choro doído que não precisa ser segurado, muito menos guardado, e agora deixei tudo aflorar pra passar logo essa angustia que não tem razão de ser. Ao abrir a caixa enorme recheada de papéis, cadernos, fotos, lembranças, pincei algumas coisas que resolvi registrar aqui pra desempoeirar bons momentos no futuro.

Lá vai:

"A soma das partes é maior do que o todo. Os novos compromissos devem ser assumidos em prol do todo", Carlos Lopes, capacitação em Redes Sociais em 2007.


por Lourdes Alves, maravilhosa em 2007, 2008, 2009, 2010 (...), repartindo seus conhecimentos e dizendo sempre a coisa certa na hora certa.

"A capacidade de desenvolvimento de uma comunidade depende de seu 'estoque de futuro', do número de seus sonhos. O desenvolvimento é um movimento em direção a aquilo que não existe, mas pode existir se o prevermos", Augusto de Franco, capacitação em Desenvolvimento Local.

"Quando digo 'redes', são redes de pessoas. Por mais importante que uma institução seja, ela não fala, não sente, não tem dúvidas. Ela é formada por pessoas", Augusto de Franco, Fórum de Desenvolvimento Local 2008.

"A caricatura é um recurso do discurso explicativo", idem.

"O Massive Change não é sobre o mundo do design, mas sobre o design do mundo. Como o design que inventamos produz a cultura em que vivemos?", Bruce Mau, no Seminário Economia Criativa em 2009.

"Diversidade Cultural não é diferença. É o que a gente faz com as nossas diferenças. Precisamos criar um pertencimento e um compromisso das pessoas com a cultura", professor José Marcio Barros, em 2009.

"Eu que nada mais amo do que a insatisfação com o que se pode mudar, nada mais detesto do que a insatisfação com o que não pode ser mudado", frase do Brecht, trazida pelo querido Augusto, que agora deve estar se perdendo em algum canto delicioso da Europa.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

novo ciclo

hoje.uma.nova.eu.vem.dançar.nesse.universo.de.possibilidades.
samba.gafieira.tango.rock.

bem que podia ser aquela valsa que eu dançava no colo do meu avô.
estou precisando de alguém pra me ninar.

Mas amanhã é outro dia diferente.que.recomeça.latejando.no.vento.frio.
E há de fazer sol!
...

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

até o verão

Acordei o sol alto já aquecia o quarto. Uma fresta de claridade penetrava pelo blackout mal fechado. Espreguicei o corpo, nenhuma dor [sorri: raramente nada dói em meu corpo]. E neste momento único de se encolher e se esticar no lençol quentinho da manhã, piscando as palpebras lentamente pra deixar o mundo entrar aos poucos, lembrei do seu olhar desabando luz em cima de mim. E não sabia mais se era sonho ou memória aquele rio correndo forte, os seus braços fortes correndo pelas minhas costas, num abraço de não ter fim. Nós correndo sobre aquela ponte até o (des)fôlego fazer as pernas pararem, a espontaneidade dos gestos, a liberdade das palavras, e o seu olhar-feito-luz sem desviar, num misto de admiração, desejo, respeito e amor. O amor, outra vez, preenchendo os poros. Na nossa gana de buscar outras possibilidades de amor, a vontade de não ir embora nunca.
Apesar do frio, apesar da hora, apesar dos outros.

Olhei pro lado e encontrei anotado numa folha amassada sobre o criado-mudo: "até o verão...".
E ainda não sei se foi sonho ou memória.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

quem vai nem sempre volta

Voltei mas lá fiquei. Deixei meu coração no castelo, minha lágrima nos gerais, meu hálito nos lençóis.
Abaixo, impressões da minha última viagem.

dia 01

Sol escaldante na cara. As costas doem, os pés doem, a cabeça lateja, os joelhos falham. A paisagem é estonteante: algo muito, muito belo pintado por Deus na terra dos homens. Cruzamos o rio, último obstáculo. Já sem mais poder sustentar meu corpo em pé, desabo num choro de falência. Puxo o ar, soluço. O que é que eu vim fazer aqui? Rapidamente a cabeça explode em dor aguda. Seco os olhos, me levanto poeirenta e entro no passado. Uma casinha de taipa toda pintada de verde claro, e dentro dela um casal esquecido no meio do mundo encantando. Os grilos cantam a noite fresca que traz prosa regada a cachaça e comida caseira tão gostosa (mais gostosa do que a da minha avó!). Prosa de simplicidade, silêncios espontâneos e nada constrangedores. Vidas vividas abrindo caminhos. Despedida com beijos e doce de goiabada.
E eu choro, emocionada por tanta generosidade, zelo e amor.


não há lugar no mundo onde nossas pernas não possam nos levar

Hoje o sol não saiu. Pegamos a estrada cedo, acordei bem disposta, mas fiz só uma parte do caminho, respeitando meu limite. Ao mesmo tempo está sendo muito prazeroso perceber a capacidade de superar limites. Descobri uma planta chamada "pedestre" que faz um chá bom de beber nessas noites frias. Enquanto bebo, me dou conta: andar, andar, andar... e cada passo é uma aproximação de mim mesma.
Não há lugar no mundo onde nossas pernas não possam nos levar.
O mundo é meu.


Caminante, no hay camino,
se hace camino al andar.

António Machado

o fácil é difícil

Sou uma pessoa prática com as palavras, mas aqui não dá pra ser assim. É preciso deixar a língua solta e os ouvidos bem abertos para entender as sutilezas nas entrelinhas. Causos e mais causos contados nas cantorias das letras comidas, nas palavras emendadas. Para ser entendido, é preciso fazer perguntas simples, falar da família, da comida, do mato. Deve-se usar vocabulário simples, e isso é muito difícil para mim. Me sinto ridícula por achar uma coisa simples tão difícil, me sinto estranha por não saber fazer uma coisa assim tão fácil. Ao lado do fogão a lenha, observo a dona Lica fazendo pão e contando do filho que mora em São Paulo e que ela não vê há 5 anos.
Saudades e solidão. Em todo lugar.

sobre o (des)conforto

Do espelho eu sinto falta. Sinto falta do conforto, mas esse estado quase natural me faz relembrar de quão pouco é preciso para viver. Mas do espelho eu sinto falta. E percebi como me tornei vaidosa nesses últimos tempos. O cabelo, o rosto mais corado, sorrir para mim mesma. Gosto de ver minha imagem, a mudança no meu semblante, que deve estar mais relaxado, apesar de tantos esforços físicos. Na casa do seu Eduardo não há nenhum conforto, mas é muito aconchegante. Parece contraditório, mas é assim. Ele tem 82 anos, corta lenha e, todas as semanas, faz o caminho até o mercado no lombo de um jegue. Ele é movido a um “remedinho”, uma pinga que ele mesmo faz com 18 ervas. Quando chegamos hoje, às 8h da manhã, ele nos ofereceu. E nós tomamos ao som de um rasta-pé.
Depois, mais andanças.

a princesa e o castelo

Hoje a princesa subiu ao castelo. Acompanhada por seu bastão mágico (fabricado sob medida pelo seu Eduardo) e por seu fiel escudeiro, João Valentão, a princesa cumpriu sua missão. Não foi simples. O caminho era repleto de obstáculos e armadilhas de lama, grandes cascos de tartaruga disfarçados de pedra se moviam baixo seus pés. Abismos, grutas, chuva, toda sorte de desafios cruzou o caminho da princesa nesta manhã. Mas, ao chegar à caverna mágica, o céu se pintou de azul e um lindo sol veio brilhar. A princesa subiu até o cume mais alto de seu castelo. Da janelinha, avistou seu reino e se emocionou. Chorou de verdade ao ver aquela perfeição toda ali posta, como se todas as pecinhas tivessem sido minuciosamente encaixadas. Naquele momento, a princesa soube que seu reino é o mundo.

desapego, simplicidade, superação

Esse lugar não existe! É muita beleza... tamanha perfeição de cores e formas. Hoje andei 25 km. Minhas pernas estão pesadas, meus pés, imundos. Mas estou muito feliz por ter feito essa travessia. Consegui falar com Deus, entrar em contato com o que há de muito profundo em mim. Foi fisicamente extenuante. Caminhar exige um grau de concentração muito alto, talvez por isso tenha conseguido me acessar, atentar para mim apenas. Eu naquele momento e naquele lugar. Acabei estentendo minha estadia por mais um dia na casa de seu Wilson. Noites em volta do fogão a lenha tomando Abaira e jogando conversa fora - literalmente - se conhecendo, se entendendo, se respeitando. Natureza exuberante, laços humanos impagáveis.
Quero voltar a este lugar.

água doce

Hoje fui tomar sol na beira do rio. Ele desce com uma força alucinante, sem parar, como se por baixo houvesse um motor girando freneticamente. Tem chovido muito à noite, então ele se modifica dia a dia, engrossando, personificando a força da natureza. A água correndo faz um barulho insistente e alto, um pouco monótono, sem variações de tempo ou intensidade. De olhos fechados, ouvindo esse ruído, fiquei bastante tensa, receosa de que o rio pudesse repentinamente se encher e me carregar pra cima das pedras. Pensei no mar e nos ciclos das ondas, que fazem um ruído nada constante, e fiquei tentando entender a lógica das corredeiras, os redemoinhos e os pontos onde as águas batem uma, duas, três vezes... foi em vão.
Não consegui entender o rio, mas consegui sentir a sua força.

amor de viagem

Cada viagem é uma viagem única. Já (quase) no final desta, uma sensação de amor profundo preenche meu peito. Uma sensação que eu gostaria que não me abandonasse nunca, de gratidão por ter olhos para ver tantas belezas, por ter sensibilidade para me emocionar com elas; por me emocionar com o despertar da consciência, com a espera, com o inesperado, com a descoberta do que já sabia mas ainda não havia sido desvelado; por lembrar e sorrir; ver o arco-íris e acreditar que se pode encontrar o pote de ouro no fim dele. Emocionar-se por perder o medo, por ter força para andar, respirar a plenos pulmões; abertura para encontrar a ternura das pessoas; tempo para reavaliar comportamentos, sentimentos, escolhas; tempo para agradecer por tudo isso.
Então meu coração parece que vai explodir de tanto amor, preenchendo todos os meus poros, fazendo-me sentir viva a cada respiração, como se eu tivesse super poderes para fazer qualquer coisa.
Ainda que tudo se transforme, porque assim é a vida, que falte a grana, o homem da vida, o trabalho dos sonhos... que o amor nunca falte!