quinta-feira, 14 de maio de 2009

moça de família

Se eu fossa filha de pais divorciados que se odeiam e se xingam, se meu pai fosse alcoolatra e minha mãe apanhasse, se ele fosse um mulherengo imbecil e minha mãe uma balzaquiana tarada, ou submissa a um machista violento... se tudo isso fosse verdade e possível, eu poderia ter uma boa desculpa para usar generalizações sobre o universo masculino - e sobre o feminino [e ainda assim relutaria, porque eu acredito no ser humano].
Acontece que eu sou uma moça de família. Bem nascida e bem criada numa família de classe média, bem educadinha mesmo. Nunca vivi num conto de fadas, nunca fui poupada dos problemas da casa - em sua maioria financeiros. Vi meus pais brigando muitas vezes - até hoje vejo - gritando, chorando, expondo o que há de verdadeiro num relacionamento: a dor, a raiva, a monotonia... e também a alegria de estar junto, de partilhar a vida, de celebrar as conquistas. Vi(vi) relacionamentos felizes (contraditórios, amargodoces, desistentes e resistentes) nascendo e se mantendo no seio de uma família burguesa e conscientemente feliz. Meus pais têm um casamento feliz. Meus avós tiveram casamentos felizes.
Então, de referências é que eu não padeço. Não tenho desculpa nenhuma pra acreditar que homens são canalhas, cretinos, machistas ou imaturos. Não acho que serei traída "porque ele é homem" (ponto). E quase nunca acho que as coisas vão dar errado: mesmo quando sinto que elas poderão não fluir, continuo querendo acreditar que elas podem dar certo de outro jeito.
Mas... tá difícil, viu? É com imenso pesar que vos confesso: tá dificil manter esse otimismo e, por ter essas referências, fica ainda mais complicado olhar pro mundo e perceber como as estruturas estão corroídas, como as relações estão no estágio anterior ao da superficialidade, gritando por um carinho, por um afago, por uma franqueza. Tá todo mundo desesperado por amor, as pessoas só não se dão conta disso.
Tô triste. (hoje) acho que não quero ter filhos.

4 comentários:

Diana Assennato Botello disse...

Adorei o seu texto. Compartilho algumas das suas considerações e de algumas eu discordo (por motivos que eu e vc sabemos). Também fui "bem educadinha" como você e, apesar de outras referências de relacionamento, não sou das mais pessimistas. Aqui tb tá foda, amiga. Esse estágio anterior à superficialidade não é nada além do hipermetrófico perímetro que os umbigos e egos (subidos aos nossos ombros) conseguem enxergar. Ou de fato querem, o que é ainda pior.
É triste e chato. Poxa, é tão legal conhecer pessoas, mundos, coisas diferentes.
De qualquer maneira, como apaixonada que sou ainda acredito na descoberta e sei que ainda estamos abertas a isso.

Beta disse...

você é demais!

R. disse...

Tá todo mundo desesperado por amor, as pessoas só não se dão conta disso.

...

a frase nesse contexto é justíssima.

E meus exemplos de relacionamentos são bem legais também. Sou quase otimista.

Juli disse...

é de repente que a felicidade volta. é de repente que todos os nossos exemplos de amores bonitos voltam a fazr sentido. é de repente que a gente volta a querer ter filhos. ou não. de repente, quem sabe, tudo vai ser diferente, e igual. um beijos nos seus pais.