terça-feira, 20 de dezembro de 2011

insônia.noite2

A sala de espera do doctor era desconfortável. Tipo muito. E o doctor sempre atrasava. Tipo muito. Nunca entendi como um ortopedista que atrasa muito podia ter sofás tão desconfortáveis e anti-ergonômicos. Enfim, ele realmente não se importava com isso. Ficávamos lá afundados horas (esperando). Um dia, ele atrasou tanto que eu terminei de ler os textos da pós, o livro que eu tinha levado e já tinha folheado todas as Caras disponíveis. Comecei a arrancar as folhas coloridas da minha agenda e fiz trinta barquinhos de presente pra ele. Quando entrei no consultório, mão cheia de barquinhos coloridos de tamanhos variados, o doctor sorriu do fundo d'alma - acho que ele nunca teve uma paciente excêntrica que fez barquinhos de papel na sala de espera e ainda entrou sorrindo "olha o que eu trouxe de presente pra você!!".

O doctor atrasava porque não tinha pressa em atender. Ele ouvia atentamente minha história de vida, me olhando nos olhos e anotando de vez em quando. Estava interessado em mim, nos porquês das minhas dores. Pediu uma bateria de exames, me revirou do avesso. Entrei naquela máquina de fotografar o cérebro, em outras tantas que detalharam todos os ossinhos do meu corpo, visitei vários laboratórios da cidade. E esperei muito na sala desconfortável. No dia do veredito, ele não usou arrodeios: "querida, seus exames estão perfeitamente normais. Clinicamente, você não tem nada". "Como assim, não tenho nada??? Tenho sim! Eu sinto dores terríveis no meu corpo desde criança, tenho enxaquecas, dores nas articulações, minhas costas parecem as de uma velha de 80 anos.... pelo amor de deus, me fala que eu tenho alguma coisa, qualquer coisa, dessas que dê pra abrir e tirar e depois costurar de novo?".

Não teve jeito.

Nesse dia, o doctor conseguiu arrancar lágrimas de mim e me olhou calado. Perdi 8 meses da vida investigando meu DNA pra descobrir que minhas dores tinham uma raiz muito elementar: minhas emoções. E eu chorava porque no fundo já sabia - só que a solução era um tantinho mais complexa do que deitar numa mesa cirúrgica, cortar e costurar. E eu não sabia nem por onde começar.

Já tinha feito tudo o que podia, experimentado todas as técnicas, de agulhas a ginásticas orgânicas, terapias de vários tipos, até remédios que me deixavam doidona. O que fazer a seguir? mudar de cidade, de emprego, de namorado, de vida?

No pain, no gain, dizia um amigo meu. Custei a acreditar, mas acho que ele tem razão. A dor é uma grande professora. Física, em última instância. E cada vez que essas dores horríveis voltam, me bate um pânico, porque dói de verdade. Mas aí eu percebo que é só porque ainda tenho muito o que aprender.
Sorte que agora eu já comecei.

2 comentários:

Gabriela disse...

Me chamo GABRIELA e sou sua seguidora.
Voce escreve sempre coisas, no minimo, interessantes e instigantes.
Hoje me fez pensar no meu proximo ano: "Nunca é tarde para ser feliz" ou melhor APRENDER a ser feliz.
Para ser bem diferente Boas Festas
Biela

Beta disse...

Olá Biela, muito obrigada.
Estamos sempre aprendendo, não é mesmo?! Que 2012 seja um ano de muitos aprendizados e felicidade.
beijos