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quinta-feira, 14 de maio de 2020

amor de quarentena

A pandemia já mudou o amor.

Ainda bem, eu diria.

Não sei, nem ninguém sabe para aonde vai esse rumo novo, mas ele será diferente.

O amor estava precisado de um susto, os relacionamentos andavam trazendo mais dor que liberdade, mais confusão que proteção, mais apego que afinidade.

Tomara que a gente precise tirar a máscara para beijar direito.

E tomara que a gente tome mais tempo para entrar nos relacionamentos e tomara mil vezes mais que a gente precise de bem mais tempo para sair deles, se assim for mesmo o melhor.

Que a gente entenda que um novo amor precisa se acostumar a amar de novo e isso demora mesmo e que os incríveis primeiros meses são anestesia gostosa para nos dar fôlego para recebermos o pacote completo que virá depois, pois sempre vem e caso não venha, ache estranho.

Todo mundo traz brindes surpresa!

Inclusive você, só para lembrar!

É no brinde que está o prêmio. É no defeito que mora a evolução.

É na implicância que mora a maturidade.

É na aceitação do outro que mora a aceitação de si.

Os amores que dão certo passam mais por proteção externa que interna.

Passam por isolamentos profundos, acomodações turbulentas, recessões doloridas, revoluções barulhentas e até um pouco antes de levantarem voo eles reclamam, duvidam, estranham e temem, mas não param de correr em direção ao impulso, pois é disso que é feita a vida a dois.

Eu espero amorosamente que tudo que está acontecendo faça de nós melhores amantes, melhores amados, em melhores voos.

Tempo Rei, oh tempo Rei, transformai as velhas formas de viver! .

Texto de Claudia Lebie
Ilustração @sabeth_art




terça-feira, 28 de abril de 2020

agradece

Abro os olhos. Mais um dia. A criança acorda. Pede comida. Reclama. Porque tem que escovar os dentes, porque tem que se trocar e lavar a própria louça do café da manhã. Essa mania dele reclamar da vida, não sei de quem puxou. Sigo dizendo: agradece, agradece, agradece! Olha como você é afortunado – e listo as razões pelas quais ele deveria apenas ser grato. Ele parece não me ouvir. Ele não me ouve. Mais um dia sem ser ouvida.

O copo está cheio. As costas doem. É um peso descomunal não ter com quem dividir a responsabilidade de criar um ser humano, em todos os níveis. Uma criança é um projeto de, no mínimo, dois. Não sou vítima. E não falo só por mim, por ser mãe solo. Falo pela grande maioria de nós, acompanhadas ou não, mas extremamente sós nesta missão de criar filh@s. Falo por esse sistema escroto que nos obriga a criar nossos homens, além de nossos filhos, para que aprendam a criar os filhos deles. Falo pela inconsciência de muitas de nós sequer nos darmos conta dessa perversidade. Ou, se nos damos, silenciamos e seguimos perpetuando esta dor ancestral. A dor de uma linhagem inteira de mulheres subtraídas de suas potencialidades, ensinadas a acreditar que nasceram para ser mães.

Rezo para me conectar a estas velhas bruxas sábias, que elas nos mostrem o que amavam e sabiam fazer e despertem em nós essa liberdade. E agradeço - porque afinal só tenho a agradecer!


quarta-feira, 18 de março de 2020

quando tudo passar

Meu sonho é que a gente acorde deste pesadelo despertos. Que um número muito grande de pessoas  dê uma grande guinada e seja incapaz de permanecer levando uma vida vazia.

Que percebam o quão possível e natural é ficar na pausa com os seus fazendo "nada", gastando "nada", comprando "nada", mas sentindo tudo. Compartilhando e refletindo sobre o valor real das coisas, sobre a essência de estarmos aqui, sobre o divino que é SER HUMANO. 

Sonho que as pessoas vivam plenamente esse ócio criativo, tocar, cozinhar, tricotar, ler, debulhar feijão, passar um café, fazer pão, prosear, contar histórias de família... e que depois de tudo se perguntem: "o que pode ser melhor que isso? por que preciso abrir mão de tudo isso para viver?"

Sonho que a gente consiga olhar para tudo que temos, olhar e agradecer, mas perceber que não precisamos de um décimo de tudo aquilo. Que, ao acordarmos, possamos reavaliar nossas necessidades materiais reais, acumular menos, doar mais.

Se doar mais. 

Sonho que despertemos deste torpor e que coloquemos nossos corações em marcha. 

[Hilma Af Klint]



terça-feira, 5 de novembro de 2019

incapaz

Sinto-me incapaz de ser amada. Assim, homem-mulher-par-companheiros. Posso dizer a verdade? Sinto. Será sentimento comum às mães de crianças pequenas? Será, ou é só minha a sensação-vento? Sinto assim, como se meu universo não encaixasse. E não é baixa estima, assim, corriqueira. Não. É uma sensação de que não pode ser. É uma sensação de desencaixe. É como se minha rotina fosse tão tão que... né? Nem dá. Nem dá. Eu tenho esse sentimento como quem olha e não habita. Como quem deseja, mas nem ousa. Como quem camufla, mas nem aprofunda. Aos que dançam sozinhos, toda uma completude. Que o seja. E esforço-me para não transparecer. Lá vai ela, mãe. Lá vai ela, sendo. Distancio dos encontros porque chove, porque chovo, porque não dou conta. De ser. Amada. Porque controlo meus impulsos com este choro baixinho. De canto. Em canto. Se me dói? Às vezes sim, noutras não. Acolho. Como joaninhas que nos alugam as saias, sigo com ela ali – presa na estampa florida. Presa e solta, mas ali. Aqui. E dá vontade de soprar: a joaninha. Vá ao vento, vá, vá.. Mas nem. Nem. Agora, sinto-me velha. Não interessam-me mais tanto as baladas, os jogos de romance, o habitar de in-serenidades. Agora, sinto que é muito mais branda e muito mais calma a necessidade. Coisa pouca. Carinho leve. Nenhum grande apaixonar, nenhuma galopada rude de arrancar os ossos. Assim, com crianças ao lado... Como crianças ao lado. Só um tilintar. Dia. Após dia. As coisas pequenas, os sentimentos profundamente silenciosos e nem por isso menos. Essa vontade de pertencer, só isso. De partilhar, só isso. Essa vontade calma. Esse recuar invisível. Esta confusa verdade. A mulher que vive em mim e que anda assim, gota. Assim, água. Assim.

[Genifer Gerhardt]

sábado, 20 de julho de 2019

alucinação

Embarcamos na estação Vila Madalena num domingo frio, perto das 23h. Antonio cansado de um dia de muitas brincadeiras, logo se aconchegou para uma soneca no banco duro do metrô vazio. Meu celular estava sem bateria, então já havia combinado com meu pai pelo telefone da Nicole para ele nos apanhar na estação Paraíso dentro de 10-15 minutos.

Sempre me dá alegria a boniteza dos rostos de vidro na estação Sumaré. Então sorrio. E ele entra no vagão. Fones no ouvido, volume mais alto do que o necessário - nessas horas, sempre me lembro do Daniel dizendo que estamos forjando uma geração de surdos. Bonito não seria bem o adjetivo para defini-lo, mas aquele ar de hipster abandonado me fez olhar para ele duas vezes sorrindo. Então ele ocupa o assento preferencial ao nosso lado. Seus poros exalam cerveja de uma tarde de domingo com os amigos. Faço carinho no Antonio. Tenho a impressão de ser uma mãe imaculada para a qual não se pode olhar, sorrir, tocar - pensei em sair por aí com um cartaz: "sou main mas não to morta!". Meu sorriso não foi retribuído nem por gentileza e foda-se também - mal sabia ele que eu sorria por dentro e não era pra ele.

De repente, um solavanco. Metrô para de supetão pouco antes de chegar ao Trianon Masp. Não é uma freada normal, é uma parada brusca. Motores e ar condicionado desligam imediatamente. Alguns segundos em silêncio no meio da galeria escura. Então ele retira os fones e pela primeira vez me olha buscando alguma conexão, algum reconhecimento, certa reciprocidade.
- Estamos parados por motivo de usuário na via, anuncia o condutor.
E ali ficamos por 10 minutos, que viraram 15, 20. Havia pouca gente no vagão, mas já se comunicavam com familiares e amigos "tamo aqui por causa de um filho da puta que resolveu se matar", dizia um. "Vai atrapalhar a vida das pessoas num domingo à noite, ah, faça-me o favor!", dizia a outra. Ele só mandava mensagens de texto e começava a suspirar ansioso. Da estação se ouviam comandos no microfone de códigos incompreensíveis: "todas as estações, DX56" Também comecei a ficar aflita porque queria avisar meu pai sobre nosso atraso.
- Será que eu posso usar seu telefone? Estou sem bateria e preciso avisar a pessoa que está me esperando na estação.
Ele me passou o celular com o rosto aflito.
"Pai, sou eu. Estamos parados no Trianon por causa de usuário na via. Sem previsão. Espera a gente".
"Estou sabendo. Estou na estação Paraíso. Teve um óbito aqui" - foi a resposta.
Olhei para aquela mensagem incrédula e passei o celular para ele com os olhos mareados. Ele leu e segurou a cabeça entre as mãos.
- Vivemos tempos difíceis...
Foi a única coisa que consegui dizer. Aliviada porque Antonio dormia e não precisei explicar para ele o que estava acontecendo, por que alguém faria isso? Calou fundo em mim a imagem de uma garota se atirando nos trilhos num domingo gélido. Como iria dormir aquele condutor de trem naquela noite? Um inocente escolhido a dedo para matar alguém. Como entender o tamanho do drama de alguém que resolve tirar a própria vida? Como manter a coragem em uma sociedade tão adoecida e desequilibrada?

Fui invadida por milhares de perguntas sem respostas. Senti calor, depois frio, depois falta de ar. Ele também ficou desbaratinado. Me olhou em busca de acolhimento. Aquele vagão vazio parecia imenso e aqueles minutos, eternos. Não precisamos falar nada. Aquela tragédia nos unia irremediavelmente de uma forma única. Apenas nós dois ali sabíamos o que havia de fato acontecido. 30 minutos dentro de um vagão parado, instantes de luto para elaborar minimamente o ato corriqueiro de sair dali e chegar em casa e tomar um banho e comer alguma coisa e colocar a cabeça no travesseiro e acordar de novo e tomar mais um metro e seguir a vida como se nada tivesse acontecido. Porque no fundo é isso que estão querendo fazer parecer: que nada acontece. Tudo é banal e estamos perdendo a capacidade de nos afetar para garantir nossa própria sobrevivência.

O metro começou a andar vagarosamente. Chegamos na estação Trianon, alguns passageiros entraram e uma moça disse que alguém havia se machucado bastante. Ao chegar no Paraíso, um suspiro de alivio. Num ato de gentileza, ele pegou minha mochila e disse: - Também vou desembarcar aqui. Acordei Antonio e saímos do vagão. De pé, os três na plataforma sem saber muito como se comportar. Pensei em apenas pegar a mochila e agradecer, mas ele então se aproximou, me deu um abraço demorado que só dois cúmplices podem dar.
Nos perdemos no meio da multidão com a promessa de não olhar pra trás.

A minha alucinação
É suportar o dia-a-dia

E meu delírio
É a experiência
Com coisas reais

[Belchior]

 
   

terça-feira, 25 de setembro de 2018

inferno astral

À beira dos 37 muito bem vividos, me emociono ao perceber como ainda me deixo ser tocada pela vida. Sigo mais suscetível do que nunca e choro as dores do outro, que são as minhas próprias. Não quero nem vou mudar isso. Manter-me permeável num mundo blindado é resistência. Manter-me sensível e disposta neste contexto acirrado é amor. Manter-me atenta ao entorno é conexão. Resistência, amor e conexão: o que mais desejar para um novo ciclo?

Neste fim de semana de emoções atropeladas, pensei um pouquinho em você - fazia tempo que você não aparecia por aqui. Pensei que talvez sejamos mais parecidos do que eu gostaria. Pensei que talvez você vote no coiso e isso imediatamente me fez espanar as poucas memórias agradáveis que ainda guardo da gente. Mas fui além e me perguntei: quanto do "coiso" existe dentro de cada um de nós que não queremos ver? Quanto de louco, radical, preconceituoso, feio, bizarro, escroto, mau, incoerente, nojento existe em você? E foi então que percebi também o quanto de você há em mim. Você que só critica e julga. Talvez por isso doa tanto te ver assim de frente.

Tudo que é perturbador é também revelador.

Talvez o segredo seja olhar no espelho e aceitar o que vier. Até o auto-engano.


sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

vai casar

Sempre fui a menos sozinha das solteiras. Aqui e acolá, sempre tinha um hômi a tiracolo, raramente estive sozinha na vida. A grande maioria das minhas amigas tinha namoros duradouros, desses de anos... eu quase nunca. Tive um - e quase casei de véu e grinalda. Por sorte percebi a tempo que ainda era muito jovem para me privar de conhecer tantas pessoas interessantes.

De fato, a escolha de não levar adiante o único relacionamento looongo que tive me trouxe mais ganhos que perdas. Tive experiências muito apaixonadas, conheci muita gente louca, vivi intensamente (claro). Se pudesse voltar atrás, faria tudo de novo.

Hoje: 36 anos, 1 filho que já se veste sozinho... acho que quero casar! Se dependesse do tanto de vezes que já peguei o buquê, devia ter fila na minha porta. Fato é que não sei bem qual modelo de relacionamento desejo. Não acredito no casamento como está posto, mas também não sei muito pra onde correr. Talvez muita gente não goste de ler isso, mas não vejo muitos casais se divertindo pela vida. Vejo conveniências, acomodações. Vejo pouca vontade de crescer junto e muito apego aos vícios e obstáculos. Devo estar errada, por supuesto, caso contrário ninguém veria vantagem em continuar casado ;)  Estas são apenas impressões de uma solteira observadora.

Se eu tivesse que dizer o que acredito mesmo, seria: as pessoas são livres, ninguém é de ninguém. Mas sigo dizendo (até para mim mesma) o que a sociedade quer ouvir: vou casar. Como conciliar estas duas visões? Como se livrar do maldito amor romântico e viver plenamente a liberdade tão própria de quem ama? Esta é uma pergunta que tem me perseguido nos últimos tempos.

Da turma mais chegada, estão todas casadas. E pra festa de Natal, na lista eu leio "Beta + Tom". Me dá uma certa angustia. Não é inveja, não é dor de cotovelo, não é medo de envelhecer solteira - já que sozinha de fato quase nunca estive! É uma incerteza que não tem horizonte. Um lugar novo em mim que chama por um par que não seja meu filho. Um par(ceiro). Pra vida.

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

despedida

Eu queria ter tido a chance de me despedir de você. De olhar lá no fundo dos seus olhos para desvendar o que sua alma guarda. Eu queria poder te dar um abraço demorado. Dizer que sinto muito. Sentir seu coração batendo pra ter certeza de que ele não congelou. Eu queria te dizer o quão injusto foi fazer tantos planos e deixar que eles derretessem como gelo no sol. Eu queria ouvir de você que existe outra pessoa, porque só assim essa ruptura covarde, virtual e insensata faria algum sentido.

Eu queria te ver frágil e sensível, sem máscaras.

Queria que se deixasse amar - independente de haver ou não algo entre nós. Eu queria mesmo que você pudesse receber este amor que estou cultivando em mim - não este amor banal, carnal. Amor de Ser Humano. Queria eu também receber seu cuidado. Não este cuidado de homem/mulher: cuidado de Ser Humano. Gente que se cuida porque se importa.

Mas nada mais importa. E não sei se algum dia de fato importou. Hoje acho que tudo não passou de um grande mal entendido. Chego a pensar que aquela manhã ensolarada podia ter amanhecido nublada e chuvosa, assim quiçá nunca teríamos nos cruzado na vida. Mas não há como mudar o que foi. Só há como mudar o que é. Essa dor que me rasga o peito, essa incompreensão, esse vazio que você deixou em mim: isso vai mudar. Hoje.


segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Comunica(dor)

Estou com muita dor. Pensei que talvez não fosse um bom momento para escrever. Mas é das dores que nascem as curas, e está sendo lindo ver isso brotar do meu corpo, da minha garganta. Arde, arranha, dói, inflamada como um vulcão.

A garganta, canal da minha comunicação: ao mesmo tempo minha fortaleza e o lugar onde me sinto tão vulnerável. Se lanço flechas, ferem. Se não lanço, o silêncio fere a mim. Profundamente. A não-resposta. A garganta (sempre ela) pigarreia para não deixar sair. Fingir não se importar nunca funcionou pra me apaziguar. Não guardo mágoas, mas as migalhas - aquelas que insistimos em não varrer - incomodam.

Já lancei muitas flechas. Já feri muito. Hoje prefiro resguardar as relações. Aguardo com paciência a sabedoria do tempo para acessar o que não falei. E o que devia ter falado. Será que devia ter falado? O que é de fato relevante? Aguardo e guardo ainda a um alto custo. Porque eu gosto mesmo é de varrer migalhas - e não para debaixo do tapete. Gosto de tudo "bem limpinho e arrumadinho", como diria alguém que eu conheço. Não deixo pra lá. Sabe-se lá onde é este "pra lá", vai que ele aparece de novo aqui - e via de regra aparece.

Então firmo aqui essa comunicação amorosa, diretamente do coração. O que eu tenho pra te falar vai te trazer curas. O que eu ouvir de você também. Vamos abrir este espaço saudável de crescimento e verdade. Verdade sempre.



domingo, 18 de agosto de 2013

engano

Era pra ter sido assim:

CENA 1 - EXTERIOR/ MANHÃ ENSOLARADA

ELA dirige um buggy. Cabelos ao vento, olhar distraído, vê ELE andando a pé. Encosta o carro.

- Oi, tudo bem? tá indo pra onde?
- Oi, tudo!! To de folga, e tu?
- Entra aí, to indo pra praia do Leão. Quer ir?
- Ah, valeu, tenho um compromisso, não vai dar.
- Beleza, a gente se encontra por aí então...
- Até, aproveita!
- Tchau.

FADE OUT.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

super mulher



Eu já não sabia mais como lidar com uma vida cheia de atribuições. Tive que me exilar numa ilha semi deserta no meio do Atlântico pra deixar de ter 4 empregos, fazer pós graduação, estudar canto, assistir a todos os filmes em cartaz, ir ao supermercado, ser bem cuidada, culta, sociável e namorável...
Não sucedi muito. Foram poucos meses de “experiência do vazio”. Logo comecei a me envolver em trabalhos comunitários, cursos, atividades mil fora o meu trabalho oficial – que eu tinha jurado que era a única coisa que eu ia fazer porque realmente precisava! Então o tempo foi me engolindo, a rotina frenética foi se apaixonando por mim novamente. Aceitei que esta é minha essência, não posso fugir dela. Não deixei de ir à praia, mergulhar, aproveitar a ilha... mas fui acumulando funções, recheando meus dias de compromissos e horários.
Então entra em cena uma barriga. Atualmente com 24 cm. Ela me impôs limites. De repente, cadê minha independência? Onde foi parar minha vontade própria? Cadê minha disposição para enfrentar jornadas de trabalho, estudo, prazer?? Essa história de gravidez é uma insanidade! Eu preciso deixar tudo em ordem pra quando meu filho chegar!!!! Estar saudável e cuidar para que ele esteja, praticar yoga, cozinhar e comer bem, ganhar e guardar dinheiro, fazer um caderninho de memórias para ele, pensar em como será o parto, onde, quando e com quem, concluir trabalhos e realizar repasses e treinamentos, lidar com o fim de um relacionamento no meio deste turbilhão emocional, cuidar da relação com meu pai, ter paciência com a imbecil que tirou 15 dias de atestado médico no trabalho, organizar chás de fraldas e ter um enxoval mínimo para receber o pequeno, cortar o cabelo, a unha, ser blogueira, conciliadora, versátil, magra e... louca??? chegaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa!

Cansei de ser super mulher.  Não quero. Não preciso.
Mas não sei como ser diferente.
#levedesespero

quarta-feira, 19 de junho de 2013

hora de acordar


Liguei pra te contar do perfume dos jasmins em flor. E falar das frutas da estação. E do banho de chuva que pensei em tomar (com você). Desta vez, não quis me preocupar com julgamentos à minha verdade, sendo contigo apenas eu mesma. Queria falar a sua língua, para que entendesses cada sílaba de mim. Tive, por um breve e ilusório instante, a certeza de que minha transparência serviria para te fazer compreender que cada ato meu foi mais uma tentativa de aproximação de mim mesma. E logo de ti.
Queria me sentir livre na sua presença - porque ainda me sinto uma estranha quando não estás. Torci para que cada palavra minha fosse um sentimento bom, e que cada sentimento se transmutasse em compaixão. E que eu pudesse apenas sorrir quando você diz o que nem sabe que está dizendo. Queria que essas lágrimas tolas parassem de insistir, me sinto ingrata por chorar em um momento tão abençoado. E que apenas as boas lembranças povoassem minha mente. Que refletida na minha íris cor de mel, eu pudesse ver seu olhar apaixonado e inocente de um dia. Queria que eu fosse a linha, e você o linho, pra sua vida bordar na minha. E fosse reaparecendo aos poucos nosso amor.
Sonho acabou, é hora de acordar.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

porvir

Não me reconheço. Ando sumida de mim mesma. A vida não está. Eu sempre disse que a indiferença é o pior dos sentimentos. Vazio. É assim que a vida está: indiferente a mim. Ela está passando por mim. De relâmpago, esqueço-me de tudo de tão bom que já fiz e já vivi, de tudo que realizei, do tanto que aprendi e ensinei. De nada valem os caminhos que viajei, o tanto que aproveitei, ri e chorei de rir, de como eu sou corajosa, audaciosa, intensa e bem intencionada. De repente, talvez tudo tenha que voltar a ser como era antes. De repente, eu não tenho certeza nem do meu próprio nome, nem da senha do cartão de crédito, nem do que me causa brilho nos olhos. De repente eu desisto de ter filhos, sonho de criança. E meu horizonte, por mais amplo que todos os dias majestoso se apresente, de repente se torna restrito, curto, limitado. Como é difícil dizer adeus ao que se ama! E jogar-se novamente no vácuo, começar do zero, mas nunca mais a mesma depois daqui. Quando a cor mais bonita do mundo pintou o céu uma tarde, eu lembro de ter falado: “pode até ser besteira o que vou dizer, mas sinto que esses são os meses mais felizes da minha vida”.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

31

De repente percebo que começo a ter rugas. São marcas indeléveis de uma vida intensa, lindamente construída sobre minhas vontades e escolhas. Trago marcas pra todos os gostos, de tristezas profundas e alegrias indescritíveis, amores muitos, viagens loucas, poucos excessos, porque sempre amei muito meu corpo.
Mas viver conforme a orientação da minha alma é muita guerra. É preciso buscar coragem lá no fundo do coração, coragem para agir com fé a amor, coragem para desapegar-se do que não está para mim. Eu, que pouco me importo com “os outros”, me percebo triste ao constatar que um ato tão puro como agir a partir das vontades da minha alma gera incompreensão alheia. Aos olhos dos outros parece descaso, parece loucura, mas na verdade é só altruísmo, porque quando você liberta, está prestando um serviço a várias dimensões, não só a você mesmo.
Esta não é a primeira solidão da minha vida – e nem será a última. Já sobrevivi antes, às vezes mais morta do que viva, e aqui estou, mais viva e fiel do que nunca. Eu amo demais, amar é coisa muito boa. E parto para novas viagens com o coração aberto, pra mostrar fotos ainda inéditas, contar e ouvir causos e descobrir novas canções.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

A primeira faz bum, a segunda faz tá

Hoje é dia de palavra que arrase. Que arrase o quarteirão, o coração, a Conceição. "Minha palavra vale um tiro e eu tenho muita munição", porque cansei de fazer cara de paisagem em meio a tanta indecência. A ostentação é indecente. A leviandade me ofende, me afeta, me fode. Me recuso a fazer parte, a ser conivente, a me misturar com a escória. Quem gosta de lavagem é porco. Tô precisando de um conhaque, de um shot, de um chute. Dar um chute. A gol. Anseio por aquele frio na barriga de antigamente, para que alguma coisa me emocione, para que qualquer coisa me motive a dar o primeiro passo. E de repente percebo a raiva como minha aliada. Ela, só ela neste momento, pode me impulsionar.

Agora é:
Atenção,
Disciplina,
Neutralidade emocional,
Observação positiva da realidade.

E chega de mimimi.

sábado, 14 de julho de 2012

nice 'n' easy

Estamos a caminho do nada. Não adianta contemporizar, adiar, fingir. É preciso de uma boa dose de coragem para admitir certas coisas, e de alguma praticidade para seguir em frente. Coragem me sobra, praticidade me falta. É que eu preciso traçar algum objetivo, começar um livro novo, começar a escrever outro livro, comprar uma casa - ou um all star - para me sentir segura do próximo passo. Preciso cuidar de mim pessoalmente, seguir um pouco os conselhos que dou pros outros. Cuidar do meu coração.
Estamos a caminho do nada,  mas você não percebeu. Eu estou pretensiosa, ambiciosa, voluntariosa. Dei um nó em mim mesma e não consigo desatar. Você é um laço de setim: esvoaçante por aí, sem amarras. Eu não queria deixar de te amar, mas é meu dever te alertar que andar a caminho do nada não me faz te querer bem. Já jurei muitas vezes não mais colocar pontos, apenas vírgulas. Mas não consigo viver com este desconforto por tempo nenhum. Paciência é uma virtude que me falta. Então ponto. Estamos a caminho de um fim doloroso, porque todos os fins são mais ou menos dolorosos, mas eu não gostaria de ser protagonista desta vez. Eu não quero mais ser protagonista de fins, entende? E pra isso, não posso começar grandes coisas. Sim, parece contraditório à minha natureza, me privar da vida assim para não sofrer. Mas é uma escolha sensata, depois de tudo. Então me ajuda a fazer tudo isso ser fácil e leve, sem muitas delongas. Nice and easy, pra que o amor permaneça entre nós.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

anemia

De repente, no meio do pontinho de felicidade, a lágrima borra o olho. Passo a ver neblinado, dia cheio de suspiros. Sobretudo quando se aproxima a noitinha, ventosa, farfalhar de folhas enlouquecidas do lado de fora da minha segurança. O gato mia. A garganta dói por algo que não é dito. E sigo sem saber o que dizer. Gostaria de me sentir diferente, de acreditar em olhares cúmplices, na possibilidade de voar juntos, em roteiros de viagem. Mas algo lá no fundo chove. E não para de chover...

sábado, 7 de abril de 2012

casamento indiano

Diariamente, os deuses indianos têm enviado pessoas especiais para iluminar meu caminho. Meu anjo de hoje foi Jatin, um moço bonito do deserto. Ele tem 27 anos, webdesigner, praticamente um playboy em jaipur, essa cidade "do interior", capital do estado do rajastão, com 4 milhões de habitantes. Jatin é sério, fechado, trabalhador. Ele pertence a uma alta casta, tem um carro bacana e, apesar de um pouco mal humorado, é bem gente boa. Um gentleman. Mas ele tem um problema: todos os seus amigos estao se casando - não, não só as minhas amigas que estão casando, tá?! "Aqui na índia, um homem de 27 anos precisa se casar, ou estar num relacionamento estável, o que não é o meu caso", disse ele enquanto me levava pra cidade rosa. "E daí?", perguntei eu ingenuamente. "E daí que meus pais já estão fazendo alguns movimentos para arranjar meu casamento. Sabe, as pessoas começam a perguntar se há algo errado, é constrangedor...". "E você vai aceitar isso?! Vai aceitar se casar com uma mulher que nem conhece e por quem nao tem nenhum sentimento??". "Eu nao tenho outra escolha", respondeu ele firme e convicto. "e depois que você começa a viver com uma mulher, você começa a gostar dela..." , essa frase saiu num tom mais resignado. Por alguns segundos, fiquei em estado de choque. Eu sabia de casamentos arranjados. Em angola já havia entrado em contato com essa realidade mais de perto, mas ontem mesmo durante o jantar conversava com uma conhecida indiana sobre isso e ela comemorava o fato das pessoas estarem se tornando um pouco mais esclarecidas e começavam a evitar esse tipo de absurdo. Então eu não entendi muito bem como o Jatin, bem apessoado, esclarecido, viajado, pudesse se submeter a esse tipo de costume. Passado o choque, pensei em reagir. Pensei, rapidamente, em pegar suas mãos tão belas, aperta-las com força, olhar bem no fundo dos seus olhos negros e pedir que ele se libertasse e buscasse seu amor. Pensei em suplicar com todo o meu amor, que diariamente distribuo por ai, que ele buscasse sua felicidade. Mas não fiz nada disso. Respirei fundo apenas e no fundo do meu coração aceitei o seu tipo de feicidade. "Espero que sua futura esposa seja uma boa mulher e que vocês se gostem muito quando se conhecerem", foi o que eu disse. Percebi, num instante, que uma coisa tão normal, quase banal pra nós, é na verdade um tesouro. Às vezes a gente se esquece do valor da liberdade.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

a chegada

quando pisei no solo encarpetado do aeroporto internacional Indira Ghandi, senti uma emocao de quem volta pra casa: coracao na garganta, uma explosao de felicidade dentro do peito. Esbocei um sorriso espontaneo de crianca que durou longos minutos. Welcome to India! Era uma e meia de uma madrugada clara e abafada. Muito cansada e um pouco gripada, pedi com amor (ao meu anjo e) ao taxista que me enfiou dentro do black cab, para que ele me levasse direto ao hotel que eu havia reservado, e nao ficasse dando mil voltas tentando me levar pra outro lugar. Jedi era o seu nome. Ele tinha uma cara boa. Sorriu e disse "all right" em um ingles quase incompreensivel, o que nao impediu uma boa prosa no caminho ate a cidade. O local do hotel era a visao do inferno, ainda mais a esta hora da noite, tudo fechado e com fogareiros isolados iluminando a estrada. Ainda bem que o Joao tinha me avisado que o lugar era "assustador", senao eu teria saido correndo, ou mesmo pedido ao Jedi que me levasse a outro hotel. Mas resolvi encarar. Desci do carro e fui andando por uma viela lugubre ao final da qual supostamente encontrava-se o tal hotel. Acho que foram os segundos 50 passos mais tensos da minha vida - os primeiros foram em Panama City, quando fui parar num bairro igualmente bizarro cercada por cafetoes e traficantes. Enfim... no hotel, o recepcionista dormia confortavelmente sobre um lencol estendido no hall. Caraca, a India eh impressionantemente caricata! Ele nao estava muito comunicativo. Fato eh que queria voltar a dormir logo e foi me dando a chave do quarto: "good night, mam". Ok, good night so se for pra voce! Como eh que eu vou ter uma good night num quarto sem janelas, aparentemente - e apenas aparentemente - limpo (eu adoro usar eufemismos!), e com lagartixas prestes a despencar do teto sobre a minha cama??? Apesar do cansaco dilacerante, dormi apenas algumas horas. O calor era insano, o lugar era insano, na verdade, eu sou insana! Pra que, me perguntei, pra que eh que eu fui deixar minha vidinha insular pra passar por isso??? Minha casinha de frente pro mar, Valentina, rede na varanda, meu preto me fazendo carinho... pra dormir com lagartixas em NOva Delhi?!??!?!?! Contudo, curiosamente, aquela sensacao de felicidade do aeroporto nao havia desaparecido. Tentei controlar o desespero e me lembrei de que, depois de tudo passado, a serenidade que brota eh incrivel e o que foi vivido faz sentido profundo. Foi assim com Noronha, onde muitas vezes me perguntei o que estava fazendo com a minha vida... Confio que sera assim tambem com esta viagem.
Depois de despertar 50 vezes no sono da manhazinha, resolvi levantar e encarar o dia - sem saber muito por onde comecar: procurar um hotel melhor ou resolver rapidamente o que precisava em Delhi para sair daqui o mais rapido possivel?? Estava muito confusa e perdida. Ha muito tempo nao me sentia assim. Muitas buzinas - quero dizer MUITAS mesmo: Napoli + Roma + Atenas + Sao Paulo na hora do rush elevado ao cubo! Todo mundo anda junto na Main Bazaar Rd. Rickshaws, velhos, taxis, motos, cegos, vacas, bicicletas, criancas, gringos...nos dois sentidos, um no sentido do outro, tanto faz, o importante eh buzinar! Tudo se auto organiza da maneira mais caotica possivel. Enquanto a velhinha quer ler minha mao, o cozinheiro me oferece pesteizinhos fritos na hora ao lado do senhorzinho que vende remedios ayurvedicos e incensos. Me sinto alimentada por tantos estimulos que nem tenho fome, ou vontade de comer. Peguei o metro, lindo e organizadissimo (de verdade), e fui comprar minha camera nova e um telefone indiano (ra!). Falei com o Brasil, comi um delicioso e apimentado falafel de lentilhas e espinafre e fui dormir feliz. Sabe que agora, ha poucas horas do desespero que durou poucos minutos, nem tudo eh tao ruim quanto parece, tudo depende de como a gente olha. E pretendo manter um olhar inocente e curioso pras coisas, pras pessoas, e me divertir com as coisas que derem "errado". Mudei pra um quarto com janela e, no apice da insonia, vi que a lua la fora ta linda, quase cheia.
Se vemos a mesma lua, nao estamos assim tao distantes, nao eh mesmo?

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

ilhada

Tô. Tô sim. Melancólica até debaixo d'água. Fui mergulhar cinza, esperando voltar azul, mas lá embaixo a melancolia só tem outro peso, outra densidade, outra cor. Ela continua penetrando, viscosa e opaca. O mar estava inquieto, exigiu concentração. Só depois, navegando de volta ao porto, barco feroz rasgando ondas escuras, me deu tempo de pensar em como a felicidade desaba sobre mim com a mesma intensidade que a tristeza. Altíssimos e baixíssimos, diria sabiamente a Gabi. Tô melancólica porque há 4 dias estou absolutamente desconectada do mundo, sem internet, sem telefone, sem a liberdade de poder me comunicar. Pela primeira vez, me sinto literal: estou ilhada. Tô melancólica porque a saudade dos meus amigos está cortante, falta-nos coragem para transpor a distância. Porque sinto falta repentina de cheiros conhecidos, de deitar no meu futon com a Vitória, fechar a porta de casa e deixar o mundo lá fora.

Hoje eu só queria soltar a cabeça no colo da minha mãe e usufruir do melhor cafuné do mundo.