Era uma tarde qualquer. Ela entrou no vagão, não reparei bem em qual estação. Logo me chamou atenção sua barriga empinada, 8 meses, talvez mais. Linda. De relance, me lembrei da minha saudosa gravidez. Fitei aquele barrigão por alguns instantes, cheguei até a sorrir. Realmente estar grávida é um estado de graça - pensei.
Então olhei para ela toda. Morena, bonita, altiva. Romantizei naquela aparência a felicidade daquela mulher. Mas então percebi que sob os óculos escuros escorria uma lágima. E depois outra. Meu coração apertou. Me levantei e fui me esgueirando por entre os passageiros distraídos. Cheguei ao seu lado, muito próxima mesmo, e a abracei. Sem pedir licença, simplesmente a abracei.
Como quem estava esperando aquele abraço, ela retribuiu. E soluçou.
- Vamos descer na próxima estação para conversar um pouco?
Ela acenou que sim com a cabeça.
Descemos do trem juntas. Ela me agradeceu. E nos abraçamos mais. Janaina estava com 33 semanas. Seu choro angustiado me dizia muito mais do que qualquer história que ela pudesse me contar. Eu sentia que ali havia uma solidão conhecida.
- Sabe, o pai do meu filho... ele é uma boa pessoa, mas ele não entende o que está acontecendo. Ele me faz promessas vazias. Ele não me ajuda em nada. Como estou cansada, como estou cansada! Eu estou tão feliz, mas tão cansada. E como vai ser quando o neném nascer?
Meu coração já pulsava na garganta. "Sim, querida, sim. Te entendo", eu dizia. Janaina era, como eu, vítima de um abandono gestacional. E olhando bem firme dentro de seus olhos falei: "Presta atenção: agora é você e o bebê! Você não pode contar com esse cara pra nada. Não fique nesta ilusão".
Foi um baque pra ela. Como uma desconhecida no metrô me abraça, me consola, me acolhe e me diz algo tão duro assim? Falei do meu sofrimento, de como o superei, de como é bom ter um filho companheiro. Ela me ouviu. Silenciamos. Seus olhos já estavam mais serenos e muito agradecidos.
- Muito obrigada. Você mudou meu dia. Na verdade, você mudou muito mais que o meu dia.
Nos abraçamos de novo em despedida. Janaina entrou no trem. Eu fiquei ali, desaguando toda a dor daquele encontro de cura. E depois subi as escadas, com um ar de dignidade que há muito tempo não sentia.
Que nós mulheres possamos nos unir e nos ajudar, com coragem, sempre e mais.
Mas dá pra abraçar algumas pessoas e fazer a diferença.
Clarissa Corrêa
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