quarta-feira, 30 de junho de 2010

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a pontuação que eu emprego no livro não é acidental e não resulta de uma ignorância das regras gramaticais. O senhor concordará que os princípios elementares de pontuação são ensinados em qualquer escola. Estou plenamente consciente das razões que me levaram a escolher essa pontuação e insisto que ela seja respeitada.

in Clarice,
de Benjamin Moser
pág. 306

sábado, 26 de junho de 2010

à margem

Acho que foi o Alessandro Buzo quem falou um lance bem bacana sobre a marginalidade. Ele disse que esse conceito está etmologicamente ligado às margens do rio: quando você está nadando contra a correnteza, é mais fácil você sair do rio e ir andando pelas margens do que, basicamente, morrer tentando.
Eu fiquei com essa imagem tão bonita na cabeça, faz meses já que eu tou pra escrever isso aqui... E hoje saquei que essa coisa de sair do rio e começar a galgar um caminho a parte serve não só para pensar as nossas malditas desigualdades sociais, mas também para momentos pessoais.

Chegou o momento de se retirar. Chega de fazer um esforço enorme.
Vou começar a caminhar nas margens.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

sobre o Amor

Desde ontem tô emocionada. Uma sensação de bem-estar me tomou repentinamente, insistindo em conviver com aquela melancolia habitual, o que, ao invés de me entristecer, está me emocionando.
Só pode ser o Amor.
No começo da aula de ontem, a Tita, inspiradíssima em mais um de seus downloads divinos, falou palavras lindas sobre o Amor. Palavras que me fizeram chorar. E como nunca antes, a certeza tão certa de que é muito mais; de que esse que conhecemos, esse Amor condicional que nos ensinaram a sentir... não é nada disso!
Amor é incondicional. E só quem sente ou já sentiu, vai entender do que estou falando. Eu falo de um Amor imensurável por todas as coisas deste mundo, mesmo as que parecem ser ruins. Com esse tipo de Amor é possível ao menos compreendê-las. Eu falo de um Amor que é superação, liberdade, predisposição.
Então, o claro entendimento: até hoje, muito do Amor que eu senti não era ESSE Amor! Daí a incompreensão, a mágoa, os medos.
E isso não tem nada a ver com Amor...

Hoje o dia foi muito legal.
Estou me sentindo livre.

terça-feira, 22 de junho de 2010

sorria!

Com frequência eu me lembro da voz da Didi, suave, falando pra gente manter um semblante sereno durante a meditação - quase esboçando um sorriso leve para suavizar a expressão. Sempre que essa orientação sopra no meu ouvido, onde quer que eu esteja, procuro segui-la, e percebo como isso causa uma mudança imediata no meu estado de espírito. Hoje de manhã, vindo para o trabalho, olhei para as caras das pessoas no ônibus, todas amarradas, sisudas. Mas havia um jovem senhor, de aparência muito simples, cuja face inteira sorria: os olhos, a tez, os lábios, as sobracelhas, todos os ossinhos do seu rosto pareciam estar em formato-sorriso. Então nossos olhares se cruzaram e por impulso eu também sorri, na tentativa de espalhar por aí um pouco da leveza que há de nos livrar deste torpor cinza.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

se

Se por acaso
A gente se cruzasse
Ia ser um caso sério

Você ia rir até amanhecer,
Eu ia ir até acontecer

De dia um improviso,
De noite uma farra

A gente ia viver com garra
Eu ia tirar de ouvido
Todos os sentidos

Ia ser tão divertido
Tocar um solo em dueto

Ia ser um riso
Ia ser um gozo,
Ia ser todo dia
A mesma folia

Até deixar de ser poesia
E virar tédio
E nem o meu melhor vestido
Era remédio

Daí, vá ficando por aí,
Eu vou ficando por aqui,
Evitando, desviando,
Sempre pensando,
Se por acaso a gente se cruzasse

[Alice Ruiz]

domingo, 20 de junho de 2010

tem dias que a gente se sente como quem partiu ou morreu. A gente estancou de repente ou foi o mundo então que cresceu?

sexta-feira, 18 de junho de 2010

confissão

Uma frase improvável varreu o meu pensamento nas últimas horas. Como aquele tom de galanteio de sempre, ele disse: "Você tem cara de apaixonada". Achei que fosse uma saída bem bolada para uma pergunta não respondida, mas me garantiu que não, que o que queria dizer era: "Você tem cara de apaixonada - pela vida!".
Não consigo intuir o que isso significa para ele... seriam meus olhos úmidos de céu azul, seria minha pele corada, minha gestualidade mediterrânea, ou meu sorriso largo? Talvez minha ironia cortante, minha franqueza reta? Ou minha espontaneidade excessiva? O que me faria parecer "apaixonada" aos seus olhos? Não sei.
Mas sei o que essa frase significa para mim: que, na maior parte do tempo, eu sou genuinamente eu mesma: vibrante com a novidade. Vidrada pela subversão. Tenho em meu signo, em minha tez, em minha voz, a necessidade de transformar. E a paixão é o motor dessa necessidade, full time. Sou movida a esse combustível assustador, que nunca se esgota. E que amedronta pela sua força.
Essa sou eu, apaixonada confessa.


Ilustração de Roberto Weigand

terça-feira, 15 de junho de 2010

estranha beleza

2010 está estranho. Estou meio amarga e ranzinza: meu olhar, que estava acostumado a ver o copo meio cheio, agora voltou a flechar pessimista e descrente. Ando muito realista e pouco sonhadora. São Paulo me parece insuportavelmente atraente: quero fugir, mas desejo ficar. A música, essa me escapa pelos dedos, e não consigo ver tanta poesia como antes.
Apesar de tudo, há uma estranha beleza no ar gelado. Desafios, escolhas, encontros. Coisas bonitas mesmo. Amanhã meu pai está voltando, depois de sete anos fora do Brasil. Ele está feliz como uma criança e pediu até pra eu ir buscá-lo no aeroporto - coisa pra qual ele não liga a mínima. Apesar do intenso frio e da baita gripe que me pegou, os dias têm sido de um azul muito azul - e eu adoro dias muito azuis. Daqui a 29 dias eu saio de férias e as possibilidades são infinitas (e todas bonitas). E na sala ao lado mora uma pessoa realmente querida, que estou aos poucos conhecendo e descobrindo, surpresa das melhores desse outono. A Vitória se esgueira por entre as minhas pernas enquanto escrevo. Mia. Ela quer conversa, lindeza.
E agora pouco, fui até a cozinha buscar um chá e dei de cara com a máquina de lavar transbordando sabão por todo lado, borbulhas brancas descontroladas. Isso podia ser muito chato, mas eu dei risada, e atentei pro doce perfume de roupa lavada que ficou na minha casa. Estranho, mas belo.

domingo, 13 de junho de 2010

limite

Algumas coisas demoramos a perceber e, às vezes, já é tarde para trocar de percurso. O limite é uma grande placa vermelha, quando o coração bate diferente, quando a realidade parece ser sonho, quando você se dá conta de que não faz a menor ideia do que vai acontecer nos próximos míseros 5 minutos.
Eu adoro um amor inventado.
Pra mim é tudo ou nunca mais.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

enquanto eu aqui, insone,
você aí, sem luz nem paz.

eu aqui, sem chão, com frio
pensando em abrir o portão e rodar como na Valsinha de Vinicius.

você aí, dormindo e sonhando
enquanto eu desaprendo a sonhar para me salvar.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

45 horas

Eu queria que meu dia fosse mais longo pra eu poder fazer tudo o que eu gosto - e ainda assim não daria tempo. Aula de canto, de percussão, de yoga, pós-graduação, trabalho oficial, trabalhos oficiosos, coletivos, boemia, projetos, fotos, blog, namorar (de vez em quando), correr, conversas prolongadas com amigos distantes, emails para responder, cursos, livros para ler, cozinhar, ir ao teatro, ao cinema, ao show, jantar com a minha mãe.
Eu queria que meu dia fosse mais longo, mas ele tá ficando cada vez mais curto.
Acho que tô precisando de férias.

domingo, 6 de junho de 2010

amigos e amantes

Minha mãe sempre me diz: "Escolha um homem para dividir a sua vida com quem você possa sobretudo conversar, porque isso é o que fica. Todo o resto passa".
De fato, é bom que nossos amantes sejam realmente nossos amigos, companheiros com quem possamos dialogar sobre tudo, e que todas as conversas sejam um tesão. É um tiquinho mais complicado quando nossos amigos se tornam nossos amantes. Difícil entender que a lógica mudou, que passamos a ter outro tipo de intimidade, que temos que compreender outras manias e razões. Perde-se a espontaneidade tão mágica da amizade, as alfinetadas bem dadas, as provocações. As reações passam a ser calculadas: já não é mais só um amigo, agora há outros interesses em jogo. E à amizade se sobrepõe então o jogo da sedução. Perde a graça.
Mulheres do mundo: mantenham intactos seus amigos!

sexta-feira, 4 de junho de 2010

on the road

Recebi hoje do Gui por email e gostei muito.

"Eu só confio nas pessoas loucas, aquelas que são loucas pra viver, loucas para falar, loucas para serem salvas, desejosas de tudo ao mesmo tempo, que nunca bocejam ou dizem uma coisa corriqueira, mas queimam, queimam, queimam, como fabulosas velas amarelas romanas explodindo como aranhas através das estrelas".
[Kerouac, On the road]

Gostei porque concordo - eu só confio nos loucos pela vida. Mais do que só confiar neles, só eles me apaixonam. Gostei também porque eu sou assim: queimo, queimo, queimo, até explodir através das estrelas. E se não for assim, não sou eu. Um pouco de loucura e muita autenticidade.

De vez em quando, eu tenho a sensação de que você nunca passa(rá). Já faz tanto tempo e tudo parece ontem, memórias tão malditamente frescas... me lembrei de quando assistimos ao filme sobre o kerouac, poeta do submundo. Foi no sitio da Pauli, naquele fim-de-semana-felicidade-sem-fim. Não raro me refiro a você como o grande amor da minha vida. Nem sei mais se isso é verdade, ou se eu me acostumei a esta ideia. Talvez eu devesse parar de dizer isso, quem sabe me esqueceria desse amor que um dia existiu forte como um carvalho.

Quem sabe eu me esqueceria de que te amei porque você é exatamente esse: louco pra viver, louco para falar, louco para ser salvo, desejoso de tudo ao mesmo tempo, que nunca boceja ou diz uma coisa corriqueira, mas queima, queima, queima, como fabulosas velas amarelas romanas explodindo como aranhas através das estrelas.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Dorothy Lamour

A cidade me engole, pareço viver três dias em um. Encontro pessoas de universos diferentes em um curtíssimo espaço de tempo, faço milhares de coisas, preencho meus sentidos com tudo o que chega. Antropofagia pura. Os dias têm sido frenéticos, é preciso me manter aquecida desse frio medonho. Eu sei me entreter, não posso negar, às vezes passo da medida. Hoje, por exemplo, meu dia durou 18 horas - e foi dividido em muitas partes legais. Uma delas foi assistir "moi, un noir" do Jean Rouche com a Ju e com o Tato. Sensacional! O cara é um gênio, o filme é simplismente uma piração, desde a concepção, até a linguagem e a edição. Uma abordagem extremamente política sem ser maçante, muito pelo contrário, utilizando bom humor e leveza. Roteiro primoroso.
A única coisa que eu realmente mudaria é a decisão final da Dorothy Lamour. Grande sacanagem, porque o Constantine realmente gostava dela. Mas como o filme imita a vida, tá tudo certo: as pessoas que se gostam também tomam decisões equivocadas.

terça-feira, 1 de junho de 2010

cutucando

Apesar de toda poesia, de tanta música, apesar de olhos inundados pelos brilhos da noite molhada. Apesar dos encontros fortuitos, do bom teatro, dos emails agradáveis, apesar das fotos antigas revisitadas, das respirações profundas. Apesar de ter finalmente conseguido começar a ler a biografia da Clarice. Apesar de tanto Noel Rosa. Apesar de tanto, apesar de tudo, un buco profondo.
Minha inspiração foge quando você não está por perto.

vazio agudo
ando meio
cheio de tudo.
{Leminski}